A Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a investigar as inconsistências da ordem de 20 bilhões de reais detectadas em lançamentos contábeis da empresa Americanas S.A. realizados no exercício de 2022 e em exercícios anteriores, ouviu, na tarde desta terça-feira (15), o Procurador da República do Ministério Público Federal no Rio de Janeiro José Maria Castro Panoeiro e o delegado da Polícia Federal da Delegacia de Repressão a Corrupção e Crimes Financeiros Acen Amaral Vatef.
Os responsáveis pelas investigações do caso em seus respectivos órgãos de atuação profissional compareceram à Câmara dos Deputados à convite da CPI com o intuito de colaborar com informações sobre as apurações e, tecnicamente, avaliar e sugerir aperfeiçoamento à atual legislação. Com investigações ainda em andamento e muitos atos sob sigilo, os servidores não foram capazes de citar nomes, suspeitas diretas e dar detalhes sobre atos já realizados no âmbito da investigação.
Enquanto o delegado Acen Vatef foi bastante econômico durante a audiência pública, colocando-se à disposição para submeter requisições dos parlamentares às autoridades e a colaborar de forma mais reservada, o procurador José Maria Panoeiro foi mais além, tecendo críticas a atuação dos executivos da varejista e, mesmo que de forma impessoal, listou comportamentos suspeitos e sugeriu aperfeiçoamento da legislação.
Questionado sobre os inquéritos instaurados, Panoeiro relembrou que no começo dos trabalho, foi provocado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) a investigar a atuação de inside trader, que é quando um funcionário da empresa negociada em bolsa usa de informações privilegiadas, sem a devida publicidade e transparência, para obter lucros e vantagens no mercado financeiro. Em seguida, porém, o procurador ampliou o escopo das investigações.
“Eu vislumbro, pelo menos, a possibilidade de associação criminosa, falsidades ideológicas, manipulação de mercado e insider trade”. Disse ainda que, se o crime de apropriação indébita tivesse “redação mais próxima do que é o peculato”, este seria mais um dos crimes a ser investigado.
De acordo com o procurador, cada balanço financeiro trimestral divulgado de forma fraudulenta configura um novo crime praticado pelos executivos da empresa. “Me parece que há um problema de fundo na operação da empresa, já que não dá resultados positivos; há uma tentativa de escamotear esses resultados negativos por um largo período, dado o tamanho do rombo contábil anunciado; e a solução final, por certo, vai causar lesão aos investidores minoritários e aos pequenos fornecedores que utilizavam a plataforma da Americanas para venda. Estes vão ser, a rigor, aqueles que vão suportar maior prejuízo”, lamentou.
Para ele, tudo aponta para que a única solução seja transformar em acionista os bancos, os maiores credores da empresa, impactando principalmente o pequeno investidor. “Como é que se vai aportar recursos novos numa empresa que está em recuperação judicial? Me parece que a situação é bem clara: é converter dívida em ação. Só que quando se converte dívida em ação, os bancos, que são os credores, vão virar acionistas na companhia. Só que qual é o impacto disso nos minoritários? Simplesmente ele vai se pulverizar. O capital do minoritário vai desaparecer”.
Questionado sobre como evitar que outras empresas optem pelo mesmo caminho adotado pela Americanas, José Maria requereu dos parlamentares legislação mais dura, que tornasse “mais alto o risco de cometer fraudes”. Sugeriu ainda um “código penal econômico autônomo”. “Ou seja, que desse coro a esse setor mais específico da criminalidade que envolve as empresas para tratar de sistema financeiro, mercado de capitais, sonegação fiscal, fraudes previdenciárias, fraudes contra fomento de agências de fomento, dentre outros. Talvez seja essa a sugestão derradeira que deixaria”.
Delações premiadas no caso da Americanas
Sem citar nomes, o procurador declarou que existem iniciativas de colaboração premiada em negociação e em homologação, com elementos concretos que conduzem, ampliam e dão assertividade às investigações em curso. Disse ainda que a colaboração partiu dos próprios envolvidos, dentre eles executivos da Americanas, que têm apresentado “provas, elementos e equipamentos corporativos” que estão ou já foram submetidos a perícias. O procurador prometeu que tão logo as delações sejam homologadas pelo juiz as compartilharia, se possível, aos membros da CPI.