O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vetou ontem (23), integralmente, a proposta de prorrogação da desoneração da folha de pagamentos para 17 setores da economia até 2027. A decisão provocou reação do empresariado e de parlamentares, que prometem derrubar total ou parcialmente os vetos do presidente no Congresso, em sessão que será marcada posteriormente.
A desoneração custa aos cofres públicos R$ 9,4 bilhões ao ano, em um momento em que a equipe econômica do governo Lula se esforça para elevar a arrecadação federal e cumprir a meta fiscal de déficit zero no ano que vem.
O projeto de lei (PL 334/23), de autoria do senador Efraim Filho (União/PB) e aprovado no Senado no fim de outubro, beneficia os seguintes setores:
- Indústria (couro, calçados, confecções, têxtil, proteína animal, máquinas e equipamentos);
- Serviços (TI & TIC, call center, comunicação);
- Transportes (rodoviário de cargas, rodoviário de passageiros urbano e metro ferroviário);
- Construção (construção civil e pesada).
Além disso, a proposta reduz a contribuição para a Previdência Social paga por pequenos municípios.
A proposta aprovada pelo Congresso permite que os setores desonerados paguem alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, em vez de 20% de contribuição sobre a folha de salários para a Previdência.
Para buscar compensação à prorrogação, o projeto também estende, pelo mesmo período, o aumento de 1% na alíquota da Cofins-Importação. Pela lei atual, a regra valeria até 31 de dezembro deste ano.
No caso dos municípios, o texto reduz de 20% para 8% a contribuição ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) das prefeituras que não têm regimes próprios de Previdência. A regra vale para cidades com até 142,6 mil habitantes.
O veto de Lula seguiu orientação do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, contrário à medida desde o início.
Durante a tramitação do PL, Haddad defendeu que o tema fosse discutido apenas na segunda fase da reforma tributária, que prevê a reformulação do Imposto de Renda e da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido). Em junho, o ministro chegou a dizer que o projeto era inconstitucional.
Empresários reagiram ao veto do presidente Lula, dizendo temer pelo aumento do desemprego. Por outro lado, economistas elogiam a decisão do presidente em razão do impacto do benefício fiscal para as contas públicas.
O veto de Lula foi publicado em edição extra do DOU (Diário Oficial da União) de ontem, às 23h53.
Desoneração da folha seria inconstitucional por criar renúncia de despesa sem apresentar impacto. Também fere a Lei de Responsabilidade Fiscal
Na avaliação dos Ministérios da Fazenda e do Planejamento, a proposta seria inconstitucional por criar renúncia de despesa sem apresentar impacto e por ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal.
“Em que pese a boa intenção do legislador, a proposição legislativa padece de vício de inconstitucionalidade e contraria o interesse público tendo em vista que cria renúncia de receita sem apresentar demonstrativo de impacto orçamentário financeiro para o ano corrente e os dois seguintes, com memória de cálculo, e sem indicar as medidas de compensação”, diz trecho da decisão publicada no DOU.
Além de custar R$ 9,4 bilhões ao ano aos cofres públicos, deputados e senadores estenderam o benefício para prefeituras, reduzindo a contribuição previdenciária de municípios.
Para a Fazenda, a desoneração da folha de pagamentos vai na contramão da tarefa da equipe econômica de elevar a arrecadação da União, ao reduzir as receitas federais. Até o ano passado, as desonerações retiraram cerca de R$ 140 bilhões aos cofres públicos.
“Você vai criar uma nova renúncia fiscal, sem lastro, sem repor. Como é que vai ficar o déficit da Previdência? Então, é uma questão de razoabilidade. Não estou pedindo nada que não seja razoável. E estou me colocando à disposição, também”, disse Haddad sobre a proposta em agosto passado.
O Ministério da Fazenda vinha argumentando ainda que a medida seria inconstitucional porque, desde a reforma da Previdência, seria vedado adotar iniciativas para reduzir a arrecadação para aposentadorias.
De seu lado, congressistas afirmam que a medida gerou alívio para as empresas e rendeu R$ 10 bilhões em arrecadação, considerando o acréscimo de mais de 620 mil empregos nos setores contemplados.
A desoneração da folha começou por meio de MP (medida provisória) do governo Dilma Rousseff (PT), em 2011, e teve sucessivas prorrogações e ampliações.
Governo já foi avisado que veto será derrubado. Economistas apontam ineficácia da desoneração
De acordo com integrantes do Planalto, o governo já foi avisado por parlamentares que a decisão de Lula será derrubada já na próxima sessão do Congresso, que ainda não foi marcada.
As 17 associações empresarias beneficiadas defendem a manutenção da desoneração. Segundo elas, além de aumentar o emprego formal, houve incremento da competitividade desses setores na economia.
Por sua vez, economistas defendem o veto. Samuel Pessôa, pesquisador do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas) e colunista da Folha de S.Paulo, disse que a decisão parece correta. “A desoneração da folha é uma política que não atingiu os resultados almejamos. Precisa ser desfeita.”
O também colunista da Folha e pesquisador associado do Insper Marcos Mendes concorda que o veto é correto e diz que o argumento de preservação de empregos não se sustenta. “Trata-se de puro lobby dos beneficiários. Vários estudos demonstram a ineficácia dessa política.”
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias e da Folha de S.Paulo