O governo de Javier Milei deixou estragar comida nos estoques das estatais, enquanto cresce na Argentina o número de famintos. O economista anarcocapitalista descumpriu ordens judiciais para que os alimentos chegassem à população por meio das cozinhas comunitárias.
Após pressão de movimentos sociais, o juiz federal Sebastián Casanello ordenou, no início do mês, que o governo fornecesse um plano para distribuir toneladas de alimentos estocados em armazéns do governo para essas cozinhas.
Porém, o governo de Milei se recusou a cumprir a ordem judicial, alegando que os estoques só seriam usados em caso de emergências ou catástrofes. A Justiça, então, autorizou uma inspeção em dois armazéns do país.
Muitos dos produtos estocados foram comprados pelo governo anterior, de Alberto Fernández. Empossado em dezembro, Milei não os distribuiu e ainda deixou que muitos estragassem ou perdessem a validade.
No fim de maio, o mesmo juiz já havia ordenado a distribuição oficial às cozinhas comunitárias de toneladas de alimentos armazenadas em depósitos do Ministério do Capital Humano, mas o governo de Javier Milei anunciou que vai recorrer da decisão porque se trata de reservas “para catástrofes”.
Na ocasião, Casanello havia exigido que o ministério, comandado por Sandra Pettovello, próxima de Milei, detalhasse os alimentos retidos em até 72 horas e procedesse “imediatamente” a sua distribuição.
As cozinhas comunitárias se transformaram na principal ferramenta social para aplacar a fome na Argentina. São mais de 45 mil lugares que fornecem duas a três refeições diárias gratuitamente à população.
Esses locais eram bancados pelo Estado nos anos do kirchnerismo, mas, com Milei, a comida parou de chegar e muitas cozinhas dependem de doações. A maioria dos trabalhadores dessas cozinhas são voluntários. O governo só precisa fazer os alimentos chegarem.
Para a oposição, não distribuir alimentos a essas cozinhas é uma estratégia política do governo de Milei para enfraquecer os movimentos sociais nas periferias do país.
Caso da distribuição de alimentos a cozinhas comunitárias no governo Milei expõe corrupção
O problema da falta de distribuição dos alimentos às cozinhas comunitárias caiu no colo de Sandra Petovello, mas Milei saiu em defesa dela, não sem antes apontar culpados.
Quem cuidava da política de segurança alimentar era Pablo de la Torre, secretário da Infância, Adolescência e Família, e ele foi demitido.
Mas a demissão trouxe à tona um sistema de pagamentos para aliados do governo através de desvios de convênios com a Organização dos Estados Ibero-americanos para comprar produtos alimentícios. Mais quatro funcionários foram dispensados.
Como escreveu Ricardo Noblat, em seu blog no site Metrópoles, “um escândalo de corrupção no governo anticorrupção. Acordos políticos com a ‘casta’ que iria ser destroçada'”.
Em abril, Milei comemorou superávit primário no primeiro trimestre do ano, pela primeira vez desde 2008. Mas a que preço? Impingindo muito sofrimento à população, principalmente aos mais pobres.
O superávit trimestral da Argentina foi de 0,2% do PIB (Produto Interno Bruto), o que representa cerca de 275 bilhões de pesos (R$ 1,6 bilhão).
Porém, o preço do superávit se vê nas ruas do país. O número de sem-teto está aumentando nas principais cidades argentinas, à medida que as duras reformas do novo governo reduzem as pensões e os salários do Estado e aumentam os preços dos aluguéis, forçando mais pessoas à pobreza.
A última pesquisa realizada pelas autoridades locais mostrou que o número oficial de argentinos que dormem nas ruas de Buenos Aires chegou a 4.009 em abril, acima dos 3.511 do ano anterior.
Os números estão se repetindo em outros centros urbanos, como Córdoba e Rosário, à medida que Milei reequilibra o Orçamento do Estado a um custo altíssimo para a economia e para os mais vulneráveis, como no caso das cozinhas comunitárias.
A ajuda a milhares de refeitórios populares foi congelada quando Milei assumiu o cargo em dezembro. Ele disse que quer acabar com “o negócio da pobreza”, mudando a forma como as instituições de caridade são usadas como intermediárias na distribuição de recursos para os necessitados.
No primeiro trimestre deste ano, cerca de 18% das famílias não conseguiam mais atender às suas necessidades básicas de alimentos e energia, em comparação com os 9,6% registrados no ano anterior, segundo relatório da Universidade Católica da Argentina (UCA).
As estimativas da UCA sugerem que quase 55,5% — ou cerca de 25 milhões de pessoas – viveram na pobreza durante os primeiros três meses do ano, um aumento de 10% em comparação com o mesmo período em 2023.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias