Com mãozinha do governo, empresas já pleiteiam usar brecha na PEC dos Precatórios para comprar bens e pagar dívidas com a União

Tesouro Nacional já prevê impacto negativo da PEC sobre o caixa da União, "se as receitas a serem usadas nesses encontros de contas estiverem previstas na Lei Orçamentária”.
12 de setembro de 2022

Empresas estão se beneficiando de uma brecha na PEC dos Precatórios para pagar concessões de aeroportos, multas ambientais e, também, para comprar imóveis da União, o que pode reduzir o caixa do governo já a partir deste ano. Os valores envolvidos são da ordem de R$ 600 bilhões.

Reportagem publicada pelo jornal O Globo mostra que a proposta de emenda à Constituição, ao mesmo tempo em que amplia o espaço fiscal do governo para turbinar seus gastos em ano eleitoral, também flexibiliza o uso de precatórios para essas finalidades.

Os precatórios são dívidas do governo decorrentes de decisões judiciais sobre as quais não é possível mais recorrer. De acordo com a reportagem, “até 2021, essas dívidas deveriam ser pagas integralmente pela União no ano seguinte à indicação feita pela Justiça. A PEC, contudo, criou um teto para essa despesa: o valor pago em 2016 corrigido pela inflação”.

Além de ampliar o espaço fiscal para gastos do governo, a PEC abre brechas para o uso de precatórios para quitação de dívidas, compra de ativos e pagamento de outorgas com a União, e as empresas já estão se adiantando para utilizar esse benefício.

Até o momento, segundo O Globo, duas solicitações nesse sentido já foram enviadas ao Ministério de Infraestrutura. Uma delas é da concessionária Inframérica, que administra o Aeroporto Internacional de Brasília (leiloado em 2012) e precisa pagar R$ 2 bilhões em outorgas. A outra é da Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa), privatizada por R$ 106 milhões para um fundo de investimento.

Ainda segundo a reportagem, esses papéis também podem ser usados no pagamento da outorga do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo. Considerado a “joia da coroa” do país,  foi arrematado no mês passado por R$ 2,45 bilhões pela empresa espanhola Aena. Além deste, precatórios também podem ser usados na futura concessão do Porto de Santos.

Uso da PEC dos Precatórios para pagamento de outorgas deve impactar o Tesouro negativamente

O caixa do Tesouro Nacional deve ser impactado fortemente pelo uso da PEC dos Precatórios o pagamento de outourgas, como no caso dos aeroportos. Lembrando que, embora a equipe econômica tente manter uma narrativa otimista de que as contas públicas estão no azul, o fato é que os gastos do Executivo federal com o pagamento de juros da dívida pública têm crescido nos últimos meses. Uma equação que envolve taxa básica de juros (Selic), inflação e dólar altos resultou em uma conta de R$ 500 bilhões nos 12 meses encerrados em maio passado, a título de despesas do governo federal com o pagamento dos juros da dívida pública. Trata-se do maior patamar em seis anos.

Em nota, o Tesouro disse à reportagem que “nesses casos, pode haver algum impacto sobre a expectativa de resultado primário previsto para determinado ano, se as receitas a serem usadas nesses encontros de contas estiverem previstas na Lei Orçamentária”.

Ou seja, com a flexibilização inclusa na PEC dos Precatórios, “as sentenças passaram a ser tratadas como verdadeiros títulos, inclusive permitindo que empresas que não tenham precatórios possam comprá-los de credores — que, por sua vez, aceitam um deságio sobre o valor da condenação para receber de forma imediata”.

O próprio Tesouro acredita que a PEC deve incentivar o uso de precatórios para recuperação de crédito pelas empresas. “A expectativa (do governo) é que o volume cresça exponencialmente”, disse em nota.

A expectativa é corroborada por um advogado entrevistado pela reportagem. Leandro Schuch, do escritório Schuch Advogados, relata que a procura pela compra de precatórios aumentou no local desde a aprovação da PEC, porque houve redução dos preços.

“Realmente, com a nova PEC, houve uma reprecificação dos precatórios, com novos cálculos de aquisição, tendo em vista a postergação dos pagamentos. Por outro lado, os credores diretos querem se livrar logo dos precatórios”, disse o advogado.

Este mês, o governo deve publicar um decreto para definir o passo a passo do acerto de contas e quais documentos devem ser apresentados conforme a transação. A medida deve facilitar esse tipo de transação.

Redação ICL Economia
Com informações de O Globo

 

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