Ainda que a convergência de uma série de fatores, como a escalada do preço do petróleo no mercado internacional, tenha contribuído para a Petrobras registrar um lucro líquido recorde de R$ 188,3 bilhões no ano passado, chama ainda mais a atenção a magnitude dos dividendos que a petroleira vai pagar aos seus acionistas: cerca de R$ 215 bilhões. Com os dividendos da Petrobras, seria possível solucionar, por exemplo, quase a totalidade do rombo do Orçamento de 2023, de pouco mais de R$ 240 bilhões. “[Isso] mostra que a Petrobras passa a ser tocada com a máxima do enriquecimento do acionista”, disse o economista André Roncaglia, comentarista do ICL Notícias, programa diário no YouTube.
No mundo, a Petrobras é a segunda maior pagadora de dividendos. O resultado de 2022 da estatal, cujo maior acionista é o governo brasileiro (36% das ações), é o maior já registrado na história de qualquer empresa brasileira.
Embora seja o maior acionista, grande parte dos dividendos não vai para o governo. “O grosso desses dividendos está indo para fundos de pensão, como o BlackRock, que é o maior fundo de hedge do mundo, com investimentos em vários países e participação em várias empresas estatais”, explicou Roncaglia.
Ao longo do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), segundo o economista, os dividendos pagos foram ainda mais estratosféricos. “Se pegar o período do governo Bolsonaro [2019-2022], o saque e a drenagem de recursos da Petrobras é ainda mais assustadora. São mais de R$ 500 bilhões transferidos para os acionistas da empresa”, disse.
Em vez de melhorias para o país, dividendos da Petrobras pagos ao governo tiveram como destino o orçamento secreto
Apesar de o governo também ter se beneficiado com a distribuição de dividendos, a grande questão é o uso dado ao dinheiro, segundo Roncaglia.
“O problema é que a gente viu que um dos destinos desse dinheiro na gestão Bolsonaro foi alimentar o orçamento secreto [moeda de troca para obter apoio no Congresso], na medida em que foram contraídos investimentos na área social, de infraestrutura, sempre com aquela ideia de que o setor privado iria assumir o comando dos investimentos e o que a gente viu foi exatamente o contrário”, pontuou.
O próprio economista pontuou que Bolsonaro deixou para o atual mandatário, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), um cenário de terra arrasada. Houve inépcia do ex-presidente na gestão de recursos, destinados, em grande parte, para o pagamento da “mesada” aos congressistas, enquanto há uma infraestrutura bastante decadente, “o que é péssimo principalmente para as pessoas de baixa renda”.
De outro lado, a Petrobras vem passando, desde o golpe contra a ex-presidenta Dilma Rousseff, por um processo de desmonte. Grande parte de seus ativos tem sido vendida e projetos em áreas importantes, como de energia renovável, foram descartados. De tudo isso, pode-se depreender, de fato, que a empresa está servindo apenas para engordar o bolso dos acionistas, como reza a cartilha neoliberal.
“A Petrobras passa por um processo de encolhimento, o qual, na minha visão, é criminoso, porque a Petrobras é um ativo do desenvolvimento que o país tem”, disse Roncaglia. “O problema disso é que a gente vai entrar num processo de transformação estrutural que o mundo está passando e isso se impõe sobre nós – não é uma escolha do Brasil”, observou.
Pelas contas do economista, se pegarmos os dividendos distribuídos nos anos anteriores, isso representa quase 5% do PIB (Produto Interno Bruto). “Atualmente, o déficit que a gente tem em investimentos em infraestrutura é de 1,3% do PIB. Então, a gente conseguiria manter dois anos de investimentos em infraestrutura com os recursos gerados pela estatal”, explicou, complementando que os dividendos pagos a acionistas nunca voltarão para o Brasil.
Para economista, Lula deve se impor para formar conselho convergente com o governo
A Petrobras sempre foi alvo de cobiça de políticos do Centrão. Agora, parlamentares do bloco utilizam uma manobra para forçar o governo a inserir nomes de aliados e manter seu poderia na estatal. A manobra foi articulada pelo gerente sênior de relações do banco BTG Pactual, Bruno Bianco.
Ele articulou junto ao Centrão e ao ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD), a lista de indicados do governo Lula ao Conselho de Administração da estatal. Bianco foi advogado-geral da União dos governos de Michel Temer e de Bolsonaro. Por isso, tem informações privilegiadas.
A lista final conta com Pietro Adamo Sampaio Mendes, presidente do Conselho de Administração, Carlos Eduardo Turchetto Santos, Vitor Eduardo de Almeida Saback e Eugênio Tiago Chagas Cordeiro. Nomes caros ao Palácio do Planalto e ao presidente da Petrobras, Jean Paul-Prates, ficaram de fora. São os casos do presidente da Fiesp, Josué Gomes, e do economista e fundador do ICL, Eduardo Moreira.
Para Roncaglia, “essa é uma batalha que o Lula não pode perder”. “Ele precisa impor a sua vontade e colocar um conselho que esteja minimamente alinhado com a política do governo”, apontou.
Na visão do economista, a Petrobras tem capacidade de “movimentar recursos importantíssimos”. Por isso, se for eleito um conselho e uma diretoria que tenham um olhar para esse ativo, não haverá mais “a drenagem de recursos na forma de dividendos para acionistas” e, também, “o resgate de investimentos para a companhia”.
Redação ICL Economia
Com informações do ICL Notícias