Artigo de Deborah Magagna e André Campedelli *
O grande debate econômico da semana passada se deu em torno da reforma tributária. Em um dos raros momentos da política nos últimos anos, ocorreu um forte consenso sobre a necessidade de aprovação do projeto, o qual, embora não tenha saído do jeito ideal, significou um grande avanço para a sistema tributário brasileiro. Agora, é preciso entender os principais pontos que foram mudados em relação à forma como os impostos serão cobrados nos próximos anos.
O primeiro ponto que deve ser levado em conta é que a reforma incide basicamente só nos impostos sobre o consumo. Não existem muitas alterações em relação à cobrança sobre a renda e a propriedade, que serão melhor explicadas posteriormente.
O que de fato ocorreu não foi uma grande mudança em relação às cobranças de impostos, mas sim uma simplificação e modernização do sistema tributário brasileiro.
Agora, temos a eliminação de cinco impostos (IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS), que serão substituídos por dois: o IBS, de âmbito estadual e municipal, e o CBS, de âmbito federal. Além disso, a forma de incidência vai ser alterada. Será um imposto do tipo IVA (Imposto sobre Valor Agregado), ou seja, só será tributado o valor adicionado na produção do bem e não mais os insumos produtivos, evitando a tributação em cascata comumente ocorrida na produção brasileira.
Outra mudança é que a cobrança será feita no local de consumo do bem e não mais no local de produção, eliminando a chamada “guerra fiscal”, quando estados e municípios reduziram a cobrança de impostos para atrair empresas para seus locais, tornando a cobrança de impostos uma verdadeira bagunça tributária.
Algumas categorias de empresas vão receber alíquotas especiais, como é o caso dos bens da cesta básica, que terão impostos zerados. Outros grupos de bens são mais polêmicos e vieram justamente do lobby realizado na formulação do texto final, como agrotóxicos, máquinas e equipamentos, produtos agropecuários etc. Isso reduziu também uma das ideias mais preciosas do texto, uma forma de “cashback”, ou seja, uma devolução monetária para famílias de menor renda para reduzir a regressividade da cobrança de impostos sobre o consumo.
Em relação à propriedade, temos agora mudanças importantes nos impostos cobrados, principalmente o IPVA. Finalmente, o imposto será ampliado para outros veículos automotores que não eram cobrados, os marítimos (como os iates, barcos etc.), e os aéreos (jatos particulares, aviões próprios etc.). Isso muda um problema moral que era a inexistência de cobrança de imposto sobre a propriedade de um item de luxo só consumido pelas pessoas mais abastadas da sociedade.
Além disso, o IPVA deve ser cobrado de maneira diferente, levando em conta o nível de carbono emitido. Ou seja, veículos mais limpos, que emitem menor quantidade de carbono no ambiente, devem ser menos taxados do que veículos mais antigos, que acabam gerando um maior impacto ambiental. Esse tipo de cobrança já ocorre na Europa há muito tempo, e pode ajudar como incentivo para a troca da frota atual por outra mais limpa no futuro.
Temos, portanto, que a reforma tributária não é uma grande mudança em relação à progressividade dos impostos cobrados, pois não reduz a carga sobre o consumo e nada coloca sobre a renda. Mas é uma reforma que modernizou a forma de se pensar a tributação brasileira, reduzindo problemas antigos, como a tributação em cascata, a alta complexidade da cobrança de impostos e a maquiagem que era possível fazer em bens e serviços buscando o pagamento de menores impostos.
Não é a melhor reforma que poderia ser realizada, mas é um passo importante. Agora, é preciso passar para outras frentes, um complemento que reduza de fato os impostos sobre o consumo e eleve a carga tributária para a renda, para que ocorra uma maior progressividade tributária no país.
*Deborah Magagna é economista do ICL, graduada pela PUC-SP, com pós-graduação em Finanças Avançadas pelo INSPER. Especialista em investimentos e mercados de capitais
*André Campedelli é economista do ICL e professor de Economia. Doutorando pela Unicamp, mestre e graduado em Ciências Econômicas pela PUC-SP, com trabalhos focados em conjuntura macroeconômica brasileira