A fatia de brasileiros que engrossou a lista de inadimplentes pela falta de pagamento de despesas com alimentos, no primeiro semestre, foi a maior em cinco anos. A disparada da inflação e a queda na renda explicam a entrada de devedores para a lista de calote pelo não pagamento da fatura de um item básico.
No primeiro semestre deste ano, 18% dos inadimplentes deixaram de quitar despesas com alimentos e, por isso, foram parar na relação dos CPFs (Cadastro de Pessoa Física) com restrição. No mesmo período, para se ter uma ideia, o valor médio do litro de leite UHT saltou 24,8% na capital paulista, chegando a R$ 6,79, conforme levantamento do Procon-SP em parceria com o Dieese.
Desde o segundo semestre de 2021, a parcela dos que não conseguiram honrar o pagamento de alimentos, e teve o nome incluído na lista de calote, chama a atenção. “Instituições financeiras nos relatam que o pessoal está pegando dinheiro [crédito] para pagar contas com alimentos do dia a dia”, diz o economista da Boa Vista, empresa de inteligência financeira e análise de crédito que fez o levantamento, para o qual foram consultados eletronicamente 1.500 inadimplentes com o objetivo de traçar o perfil desses consumidores.
Os principais motivos alegados para a inadimplência no primeiro semestre foram o desemprego (apontado por 28% dos entrevistados) e a diminuição da renda (24%), que ficou 3 pontos percentuais acima do levantamento no semestre anterior.
A inflação do grupo alimentação e bebidas acumula alta de 14,72% no acumulado em 12 meses, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o índice oficial de inflação do país — valor superior ao da variação do indicador como um todo no mesmo período (que foi de 10,07%).
Contas diversas não pagas, que incluem as de educação, saúde e lazer, além de impostos e taxas, são apontadas como as despesas que ainda têm levado a maior parte dos consumidores à lista de inadimplentes (23%).
A percepção dos entrevistados é de que o quadro do endividamento pessoal piorou muito. Do segundo semestre de 2021 para o primeiro deste ano, a parcela de consumidores que se considera muito endividada subiu de 32% para 37% — a maior marca desde 2019, quando esse resultado atingiu 39%.
Na semana passada, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central elevou para 13,75% a taxa de juros básica da economia, a Selic. Foi a 12ª alta consecutiva na tentativa de segurar a inflação, e o comitê sinalizou que poderá continuar subindo a Selic na próxima reunião, marcada para setembro.
Com juros e inflação ainda em alta e atividade fraca, a perspectiva é de que a inadimplência continue crescendo nos próximos meses, até o ano que vem, com o número maior de inadimplentes e mais nomes na lista de calote.
Despesas com alimentos: preço do litro do leite já é mais alto do que o do litro da gasolina
O preço do litro de leite engatou escalada nos últimos meses e superou o da gasolina em cidades como São Paulo.
O valor de R$ 6,79 supera em 14,1% ou R$ 0,84 o preço médio do litro da gasolina comum no município em julho, calculado em R$ 5,95 pela ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis). O combustível caiu 13,5% no mês passado em São Paulo, em um movimento similar ao registrado em outras cidades do país, conforme a pesquisa da agência.
Em julho do ano passado, o litro da gasolina na cidade de São Paulo estava em R$ 5,468, conforme a ANP. O valor superava em 38,4% o preço médio do litro de leite à época, calculado em R$ 3,95 na pesquisa divulgada pelo Procon-SP.
Também em julho do ano passado, o consumidor paulistano gastava R$ 13,04, em média, para comprar um litro de leite (R$ 3,95) e um pacote de café em pó de 500 gramas (R$ 9,09).
Um ano depois, em julho de 2022, a quantia total ficou 71,5% maior: R$ 22,36. Além de o preço do leite subir, para R$ 6,79, o café também avançou, para R$ 15,57. O café aumentou em um contexto de demanda global firme e oferta menor no país.
A situação de aumento de preço dos alimentos pesa mais sobre o bolso dos mais pobres, que comprometem uma fatia maior do orçamento com a compra de produtos de primeira necessidade, como o leite, e não possuem carro próprio. A redução de alíquotas do ICMS (imposto estadual), medida eleitoreira do Governo Bolsonaro, provocou queda do preço da gasolina, favorecendo principalmente os proprietários de automóveis. Não trouxe, porém, benefícios aos mais pobres.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias