O Banco Mundial se debruçou sobre o projeto de reforma tributária que tramita no Congresso brasileiro e concluiu que o cashback, devolução parcial de tributos pagos pelos mais pobres sobre a cesta básica, beneficia os mais pobres. Sem esse item, o estudo inédito da instituição conclui que a desigualdade tributária entre ricos e pobres persistirá.
De acordo com o estudo, os 30% mais pobres continuarão com uma carga sobre a renda superior à dos 10% mais ricos se o cashback não for instituído, pois as desonerações sobre bens e serviços considerados essenciais previstas na PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 45/19 reduzem muito pouco a tributação dos mais pobres e também beneficiam as pessoas de alta renda.
Esse é o caso, por exemplo, do benefício para a cesta básica, que existe hoje e, mesmo se ampliado, não resolveria o problema.
“Se a lista de itens da cesta básica isenta for reduzida e os recursos equivalentes das receitas potenciais forem revertidos a um regime de cashback direcionado, um sistema tributário indireto muito menos regressivo poderia ser alcançado”, afirmam os responsáveis pelo relatório “Impactos distributivos da Reforma Tributária no Brasil: cenários relativos à isenção da cesta básica”, conforme publicado pela Folha de S.Paulo.
Para o Banco Mundial, reduções e isenções não são as melhores ferramentas para aliviar a carga tributária das famílias mais vulneráveis.
Ainda segundo a instituição, se for mantido o atual texto em debate no Congresso, a tributação do consumo no Brasil continuará a ser regressiva, ou seja, os mais pobres continuarão a ter uma parcela maior da renda comprometida com esses impostos do que os mais ricos. “A regressividade se mantém mesmo com isenções na cesta básica”, diz a instituição.
No mês passado, o secretário extraordinário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, já havia alertado que as exceções instituídas pelo Congresso Nacional na PEC 45/19 reduziram o espaço para a devolução parcial de tributos pagos pelos mais pobres sobre a cesta básica. Ao mesmo tempo, Appy disse que o cashback poderá ser instituído, mesmo que em escala menor que o originalmente previsto.
“Ao optar por fazer desoneração da cesta básica e de outros produtos, o Congresso Nacional, vamos ser bem claros, reduziu o espaço para fazer o cashback. Não quer dizer que não terá. Existe a possibilidade de ter o cashback, mas ele certamente será menor do que poderia ser”, afirmou.
O projeto de reforma tributária tramita no Senado e deve ser votado até novembro.
Estudo do Banco Mundial diz que reforma tributária reduz carga sobre o consumo de 90% das famílias
O estudo inédito do Banco Mundial foi assinado pelo economista sênior do grupo de pobreza e equidade, Gabriel Lara Ibarra, e pelos consultores da instituição Ricardo Vale, Eduardo Fleury e Kajetan Trzcinski.
Conforme o estudo, a reforma tributária vai reduzir a carga sobre o consumo de 90% das famílias, mas o mecanismo de devolução parcial de tributos pode superar R$ 300 por mês para baixa renda.
O trabalho divide os brasileiros em dez faixas de renda de acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e mostra o percentual da renda comprometido com os tributos sobre o consumo alvo da reforma (IPI, ICMS, PIS, Cofins e ISS).
Além disso, o estudo mostra que um benefício mais restrito para a cesta não prejudica a faixa de renda próxima da média brasileira, que ainda teria sua carga reduzida em relação à situação atual.
“Quando você elimina essa diferenciação entre bens, focaliza em fazer uma proteção das populações vulneráveis, essa é uma maneira mais eficiente de apoiar esses grupos”, disse Ibarra à Folha.
A proposta de reforma tributária prevê a possibilidade de redução de tributos para alimentos e produtos de higiene, sendo que alguns desses itens podem ter isenção total. A lista dos itens beneficiados ainda não está fechada.
Segundo os autores, um dos motivos pelos quais a desoneração da cesta tem baixo efeito distributivo é que, para viabilizar um benefício tributário, é necessário onerar os demais produtos.
Como os 10% mais pobres gastam cerca de 20% da renda com alimentação, acabam pagando mais caro pelos 80% restantes dos seus gastos.
“Quando se faz uma exceção para a cesta básica, você está aumentando o IVA [novos tributos sobre o consumo] para 80% do consumo dos pobres”, salientou o economista.
Além disso, essa política deixaria parte da desoneração com a cadeia produtiva, não com o cidadão. Agronegócio e supermercados estão entre os principais críticos de restrições à desoneração da cesta e ao cashback para os mais pobres.
Por outro lado, uma cesta básica nacional mais concisa e com isenção pode reduzir os preços de bens essenciais e, ao mesmo tempo, abrir espaço fiscal para políticas redistributivas de forma mais eficaz, segundo a instituição.
Uma cesta básica mais restrita, pelos cálculos dos autores do estudo, permite a devolução de cerca de 40% dos tributos arrecadados das famílias do CadÚnico (Cadastro Único), resultando em uma restituição média mensal de R$ 116 por família.
Um cashback mensal para todas as famílias do CadÚnico seria de R$ 318 (R$ 435 se os valores fossem atualizados pela inflação) se a devolução fosse de 100% do que essas pessoas pagam.
Para fazer a devolução sem aumentar a carga tributária total, seria necessário criar um sistema sem exceções ou alíquotas reduzidas para outros produtos.
“Sem qualquer custo fiscal adicional, um cashback direcionado seria o sistema mais vantajoso para os vulneráveis”, concluiu o relatório.
Redação ICL Economia
Com informações da Folha de S.Paulo