O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou na quinta-feira (10) que a instituição avalia alternativas para reduzir a inadimplência nas operações com o rotativo do cartão de crédito, quando o cliente não paga o valor total da fatura e joga a dívida para o mês seguinte. Uma proposta do Banco Central para o rotativo do cartão de crédito deve ser apresentada nas próximas semanas. Atualmente, a inadimplência do crédito atinge cerca de 50% das operações, um índice sem precedentes em outros países, informa a reportagem publicada no site G1.
Nesta sexta (11), Campos Neto afirmou que o Banco Central continua trabalhando em novas funcionalidades do PIX, o sistema de transferência de recursos em tempo real, e avaliou que isso poderá ser, no futuro, uma alternativa ao cartão de crédito.
“É super importante, a gente está fazendo várias políticas com o PIX crédito, que vão desafogar e dar alternativas. Mas a nossa ideia era dar uma opção que passasse por ter um parcelamento, e não ter o rotativo. De tal forma que a gente conseguisse equilibrar os números por produto. É importante que o cartão de crédito continue a ser uma alternativa viável”, declarou, durante participação no Fórum de Gestão Empresarial da Federação das Associações Comerciais e Empresariais do Estado do Paraná (Faciap).
Ainda não há informações detalhadas sobre como funcionaria o PIX na modalidade de crédito, pois o produto ainda não foi oficialmente lançado. A ideia é autorizar os bancos a oferecerem empréstimos por meio dessa ferramenta – inclusive com parcelamento (como ocorre atualmente com o cartão de crédito).
O rotativo do cartão de crédito também tem preocupado o governo. Em abril, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que iria negociar com as instituições financeiras uma redução da taxa de juros cobrada nas operações com o cartão de crédito rotativo – a linha de crédito mais cara do mercado. Haddad, junto com banco e parlamentares, fecharam acordo na terça-feira (8) sobre o texto do projeto de lei (PL 2685/2022) para acabar com o juros abusivos no rotativo do cartão de crédito.
Os juros desse tipo de crédito são considerados abusivos por especialistas – em junho, chegaram a 440% ao ano, a maior taxa do mercado financeiro. Segundo o Banco Central, esse patamar equivale a uma taxa de juros de 15% ao mês.
Uma alternativa seria extinguir o rotativo do cartão, acionado automaticamente sobre o saldo devedor. Segundo a reportagem do site G1, Campos Neto estuda, em substituição ao rotativo, enviar o devedor diretamente para um parcelamento desse saldo – com juros de cerca de 9% ao mês, pouco acima da metade dos 15% atuais.
Além da taxa abusiva do rotativo do cartão de crédito, o BC está de olho nas 13 parcelas sem juros, modalidade que não existe no resto do mundo
Campos Neto também citou incômodo do BC com o sistema atual de financiamento por cartão de crédito, que permite aos correntistas parcelar compras em até 13 parcelas sem juros. Essa modalidade também não existe no resto do mundo. “É como se fosse um financiamento de longo prazo sem juros”, avaliou o presidente do Banco Central.
Segundo ele, o BC estuda em criar algum tipo de “tarifa” para desincentivar a compra desenfreada no crédito em uma quantidade muito grande de parcelas – o que, com frequência, leva o comprador a perder o controle da própria fatura.
Vale ressaltar que, para alguns analistas, a proposta coloca em risco a recuperação do varejo e a retomada econômica. Embora a suposta intenção da autoridade monetária seja reduzir a inadimplência e combater as altas taxas de juros no crédito rotativo do cartão de crédito, que chegam a mais de 440% ao ano, essa medida pode ter consequências adversas para os consumidores e comerciantes, impactando negativamente a economia e a inclusão financeira.
Primeiro, porque o parcelamento sem juros, ainda que tenha uma taxa embutida nas vendas, é uma prática amplamente difundida no Brasil e representa a principal alternativa para a população de menor renda e para a própria classe média adquirir produtos e serviços essenciais. Estima-se que tal modalidade já represente cerca de 51% das vendas no comércio. Segundo especialistas do varejo, limitar ou eliminar essa opção afetaria negativamente o acesso da população a itens como eletrodomésticos, medicamentos e outros bens duráveis, prejudicando o consumo e a qualidade de vida da população.
Caso o governo limite as compras com parcelamento sem juros, como Campos Neto propõe, haveria menor demanda por produtos e serviços, o que, por sua vez, poderia afetar negativamente os níveis de atividade econômica no varejo e na indústria. Além disso, o parcelamento sem juros é um instrumento de inclusão financeira para muitos brasileiros que não têm acesso a outras formas de crédito mais tradicionais. A possibilidade de diluir o custo de bens e serviços ao longo do tempo ajuda a planejar melhor o orçamento doméstico, evitando dívidas incontroláveis e proporcionando uma maneira mais equilibrada de consumir. Campos Neto alega que, sem esse mecanismo de vendas no comércio, os juros no rotativo poderiam cair de 15% para 9% ao mês – o que já seria altíssimo, sob qualquer parâmetro.
Fim do parcelamento poderia ajudar lobby do setor financeiro
A proposta de limitar o parcelamento sem juros também pode ser vista como uma tentativa de manter o domínio dos bancos tradicionais sobre o mercado de cartões de crédito. Fintechs e empresas de pagamento têm introduzido inovações e competido de forma saudável, trazendo benefícios para os consumidores, como melhores serviços e taxas mais baixas. Restringir o parcelamento sem juros poderia prejudicar essa concorrência e limitar a oferta de soluções no mercado.
Embora os grandes bancos aleguem que o parcelamento sem juros é a causa principal dos juros altos no crédito rotativo, que tem no Brasil as maiores taxas do mundo, essa visão desconsidera aspectos mais complexos do mercado financeiro e também retira dos consumidores a responsabilidade que devem ter ao utilizar os seus cartões. Embora a medida de Campos Neto pareça vir com boas intenções, a consequência será um freio na atividade econômica, em que os bons consumidores pagarão pelos excessos alheios e deixarão de ter acesso a vários produtos e serviços.
Congresso acumula propostas para limitar rotativo do cartão
Paralelamente às ações do Banco Central, o Congresso Nacional acumula propostas sobre o tema apresentadas nos últimos anos e que defendem, por exemplo, a limitação dos juros cobrados sobre o rotativo.
Na Câmara dos Deputados, por exemplo, os deputados Arthur Maia (União Brasil-BA) e Elmar Nascimento (União Brasil-BA) apresentaram propostas com teor semelhante e que atribuem ao Conselho Monetário Nacional (CMN) o poder de definir qual o percentual dos juros cobrados no rotativo.
Também na Câmara, uma proposta apresentada pelo deputado Lindbergh Farias (PT-RJ) estabelece que, em caso de rotativo do cartão de crédito utilizado os microempreendedores individuais, os chamados MEIs, o limite dos juros será de 8% ao mês.
Já no Senado, Jader Barbalho (MDB-PA) apresentou uma proposta que determina que instituições integrantes do sistema financeiro nacional só podem cobrar de juros do rotativo até o equivalente a duas vezes o valor do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do mês anterior.
Na avaliação do presidente do Banco Central, o limite da taxa de juro cobrada sobre o cartão de crédito rotativo poderia levar os bancos a retirarem o crédito de correntistas com “maior risco” de não honrar a fatura, o que prejudicaria o consumo e o varejo.
Redação ICL Economia
Com informações do site G1 e do Brasil 247