O governo Bolsonaro anunciou novo bloqueio de R$ 5,7 bilhões no Orçamento de 2022 para evitar o estouro do teto de gastos que limita o crescimento das despesas. Quando se atinge o limite, o bloqueio de recursos é obrigatório para o governo. O novo bloqueio pode impor um apagão na máquina pública a pouco mais de um mês do fim do mandato do atual presidente, como o cancelamento da emissão de passaporte pela Polícia Federal por falta de verbas e também o cancelamento do serviço de carro-pipa, que leva água potável às famílias do semiárido nordestino. A suspensão, por falta de verbas, prejudica 1,6 milhão de pessoas.
O novo bloqueio deixa um saldo de apenas R$ 3,6 bilhões para todo o governo federal atravessar o mês de dezembro. O valor não inclui despesas como salários e benefícios sociais, uma vez que elas são obrigatórias.
Caso o novo bloqueio de R$ 5,7 bilhões precise ser implementado pela equipe econômica, o bloqueio total chegará a R$ 15,4 bilhões, deixando poucos recursos para a máquina pública seguir rodando no último mês de 2022. A situação é avaliada como crítica, e outros serviços podem sofrer paralisações.
O secretário especial de Tesouro e Orçamento, Esteves Colnago, explica que o governo nunca passou tão apertado assim, o normal é vir flexibilizando os bloqueios no Orçamento. Para a reportagem da Folha de S Paulo, Colnago afirma que o novo bloqueio de despesas vai incidir quase todo sobre os gastos discricionários de ministérios, que bancam custos com o funcionamento, compra de materiais ou investimentos. As emendas parlamentares que ainda estavam disponíveis já estão todas bloqueadas. Há uma pressão crescente pela liberação desses recursos.
Em setembro, o valor total bloqueado no Orçamento havia alcançado R$ 10,5 bilhões, sendo R$ 7,9 bilhões em emendas de relator (instrumento usado como moeda de troca nas negociações políticas com o Congresso) e R$ 2,6 bilhões em despesas de ministérios. Uma parte pequena chegou a ser liberada, mas a situação de aperto se impôs novamente.
Novo bloqueio poderia ser evitado com aprovação de PL ou inclusão de dispositivo na PEC da Transição
Hoje o teto de gastos precisa ser respeitado em dois momentos: na inclusão das despesas no Orçamento e no efetivo desembolso financeiro para pagar as ações. Um projeto de lei em tramitação no Congresso busca flexibilizar a primeira exigência, permitindo a previsão de despesas que serão quitadas só no próximo exercício sem a necessidade de cancelar gastos de outros órgãos.
Na prática, o valor que será efetivamente pago em 2023 não precisaria ser contabilizado no teto deste ano, e o espaço deixado por isso pode ser aproveitado para outra despesa.
Na área técnica do TCU (Tribunal de Contas da União), a avaliação preliminar é de que o PL é inconstitucional, pois altera o funcionamento do limite de despesas —que é previsto na própria Constituição.
Não se descarta ainda incluir algum dispositivo na PEC (proposta de emenda à Constituição) da Transição, patrocinada pela equipe do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), para permitir a ampliação de gastos no fim deste ano para resgatar os ministérios mais comprometidos. A avaliação é que só o projeto de lei pode não ser suficiente para aliviar a pressão sobre o Orçamento.
O projeto de lei originalmente só alterava a data-limite para abertura de novos créditos no Orçamento. Um dos trechos do parecer desconta do teto de gastos os ajustes referentes a despesas primárias que são empenhadas no fim de um ano, mas só têm impacto financeiro no início do exercício seguinte —como ocorre com a folha de pagamento de servidores e da Previdência Social.
O empenho é a primeira fase do gasto, quando o governo assume o compromisso de efetuar aquele pagamento. No caso dos salários e benefícios, o empenho é feito em dezembro, mas parte do desembolso só ocorre em janeiro, conforme o cronograma das folhas.
O parecer ainda permite contabilizar no Orçamento apenas a previsão de repasse efetivo referente à lei Paulo Gustavo de incentivo à cultura. Bolsonaro chegou a editar uma MP (medida provisória) para adiar o gasto de R$ 3,8 bilhões, mas o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu que a medida é inconstitucional —forçando o governo a incluir a despesa na previsão orçamentária do ano.
“A despesa da ‘Lei Paulo Gustavo’, após abertura do crédito, não terá execução completa até o encerramento do exercício. Dada a natureza financeira de verificação do teto de gastos, se faz necessário incorporar a efetiva projeção de pagamento até o encerramento de exercício, de modo que o espaço do teto não seja comprometido com essas despesas”, diz o parecer do projeto.
Segundo Colnago, o projeto liberaria um espaço de R$ 3,8 bilhões se aprovado, referente à Lei Paulo Gustavo. Mas ele disse que ainda não há posição consensual dentro do governo sobre apoiar ou não a medida, uma vez que ela promove outras mudanças mais amplas.
Os técnicos do Ministério da Economia também avaliam que a flexibilização do teto proporcionada pela proposta é limitada, uma vez que a regra fiscal é prevista na Constituição. “Tem uma redação mal escrita na Constituição, que mistura orçamentário e financeiro. O projeto busca fazer melhor separação, mas nós temos uma trava que é constitucional, ele fala o que deve computar no teto.
Em relação à reavaliação do Orçamento, além da inclusão da despesa com a Lei Paulo Gustavo, o governo precisou incorporar uma previsão adicional de R$ 2,3 bilhões em gastos com a Previdência Social.
Apesar do quadro de aperto do lado das despesas, o Ministério da Economia projeta um cenário ainda mais favorável na arrecadação. A estimativa de superávit primário subiu de R$ 13,5 bilhões em setembro para R$ 23,4 bilhões na avaliação feita agora.
Até o fim do ano, o órgão prevê uma melhora ainda mais sensível. A perspectiva é que as contas do governo central —que reúnem Tesouro Nacional, Previdência e Banco Central— tenham um resultado positivo de R$ 38,7 bilhões. Se confirmado, será o primeiro superávit desde 2013.
O governo também reviu sua estimativa de arrecadação para 2023, primeiro ano do novo mandato de Lula. O projeto de Orçamento foi enviado em agosto com uma previsão de déficit de R$ 63,5 bilhões. Agora, o rombo foi reduzido a R$ 40,4 bilhões, embora ainda permaneça no terreno negativo. Segundo a Economia, a revisão decorre de uma ampliação de R$ 23,1 bilhões nas receitas previstas com tributos e dividendos de empresas estatais.
Redação ICL Economia
Com informações da Folha de S. Paulo