Comércio exterior: empresas deixaram US$ 54,1 bilhões fora do país. Reservas podiam ser até US$ 80 bilhões maiores

Valor corresponde a 43,4% do superávit de US$ 124,7 bilhões obtido com a balança comercial nos 24 meses encerrados em dezembro de 2023, período de comparação.
12 de março de 2024

As empresas brasileiras deixaram, fora do país, US$ 54,1 bilhões obtidos com comércio exterior nos 24 meses terminados em dezembro de 2023. O valor corresponde a 43,4% do superávit de US$ 124,7 bilhões obtido com a balança comercial (exportações menos importações) no mesmo período. Entre as explicações para esse fenômeno estão os juros mais atrativos no exterior.

Os dados fazem parte de estudo feito pelo pesquisador Bráulio Borges, do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), que também é economista sênior da área de macroeconomia da LCA Consultores. Os cálculos foram feitos a partir de dados compilados do Banco Central. As informações foram publicadas em reportagem da Folha de S.Paulo.

Desde 2008, os exportadores brasileiros têm autorização para manter no exterior 100% dos recursos relativos ao recebimento de suas vendas de mercadorias. Até então, as receitas tinham de ser internalizadas no prazo de um ano.

A partir de 2020, ou seja, durante a pandemia de Covid-19, o gargalo entre o que ficava fora e o que entrava no país começou a ser observado.

Para realizar o cálculo, o pesquisador comparou o quanto o país gerou de divisas ao registrar um saldo comercial positivo com o montante de recursos que efetivamente ingressou no Brasil, medido pelo fluxo cambial.

A partir dessa comparação, a diferença entre os US$ 124,7 bilhões de saldo “competência” (saldo comercial positivo) e os US$ 70,6 bilhões de saldo “caixa” (fluxo cambial) mostra o montante que não ingressou no país no período analisado.

Os US$ 54,1 bilhões leva em conta o saldo comercial, que é a diferença entre exportações e importações.

Comércio exterior: reservas internacionais do país podiam ser maiores

O pesquisador acredita que os juros mais atrativos no exterior na comparação com o ambiente doméstico e eventual estratégia das empresas brasileiras de manter maior parte das receitas fora do país, para custear subsidiárias, por exemplo, podem estar entre as razões.

O período que as empresas fizeram essa opção coincide com a época em que o Banco Central reduziu a taxa básica de juros, a Selic, à mínima histórica de 2%, entre agosto de 2020 e março de 2021.

Contudo, mesmo depois de início do ciclo de alta da Selic, essa estratégia se manteve, pois os juros nos Estados Unidos também seguem em um patamar considerado elevado para a economia daquele país (entre 5,25% a 5,5% ao ano).

Para o economista, o comportamento dos juros será determinante para que seja possível observar uma mudança ou não de tendência à frente.

“A questão é o ritmo. Quem vai cair mais rápido e quando? Hoje é a Selic que está caindo mais rápido e gera um incentivo maior para o exportador deixar o dólar lá fora”, disse.

O pesquisador ainda salientou que as reservas internacionais do país, ativos do Brasil em moeda estrangeira que funcionam como uma espécie de colchão de segurança frente a crises, por exemplo, podiam ser maiores.

“O Brasil poderia estar hoje com quase US$ 80 bilhões a mais de reservas, se toda a receita com divisas tivesse sido internalizada nos últimos três anos”, pontuou.

No primeiro ano do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), as reservas internacionais do Brasil fecharam 2023 em US$ 355 bilhões — avanço de 9,34% frente um ano antes e o nível mais alto desde março de 2022.

Esse patamar de reservas é significativamente mais alto do que o mínimo estimado pelo FMI (Fundo Monetário Nacional) como adequado para o país.

Procurada pela reportagem da Folha, a Secex (Secretaria de Comércio Exterior), ligada ao MDIC (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços), disse que “monitora e analisa o fluxo físico de mercadorias do comércio internacional, mas não possui acesso aos dados detalhados dos fluxos financeiros”.

Afirmou também que não tem como “avaliar as decisões negociais/estratégicas das empresas quanto à internalização ou não dos recursos”.

Redação ICL Economia
Com informações da Folha de S.Paulo

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