O governo federal encaminhou ofício às quatro principais estatais (Petrobras, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e BNDES) para que tentem antecipar o pagamento de dividendos neste ano. O objetivo do pedido é ajudar o Executivo a incrementar os recursos para bancar gastos extras criados a partir da PEC (Proposta da Emenda à Constituição) Eleitoral, que abriu um espaço de R$ 41,2 bilhões no orçamento de 2022 para o pagamento do Auxílio Brasil, no valor de R$ 600, além de benefícios distribuídos para taxistas e caminhoneiros já a partir de agosto.
Os dividendos são uma parte do lucro das empresas distribuído aos seus acionistas. No caso das estatais listadas em bolsa (Petrobras e BB), o principal acionista é a União. Caixa e BNDES têm como único acionista o governo federal.
A decisão de antecipação dos dividendos caberá às empresas e será preciso avaliar se o pedido pode afetar a manutenção da saúde financeira delas. O Banco do Brasil respondeu dizendo que não seria possível atender ao pedido do governo, enquanto as demais estatais ainda não se pronunciaram, conforme o secretário especial de Tesouro e Orçamento do Ministério da Economia, Esteves Colnago.
A Petrobras tem uma política de dividendos trimestral, enquanto o BNDES paga ao governo semestralmente.
Além dos gastos extras com o PEC Eleitoral, o governo diminuiu suas receitas com a desoneração dos impostos federais da gasolina (o governo zerou o PIS/Cofins e a Cide do combustível). O pedido denota a desorganização do governo, que, a poucos meses antes da eleição de outubro, tem lançado mão de artifícios para impulsionar a candidatura à reeleição do presidente Jair Bolsonaro.
Somado ao gasto extra originado com a PEC mais a redução dos impostos federais sobre a gasolina (R$ 16,5 bilhões), o impacto no caixa do governo será de R$ 57,7 bilhões.
Até agora, o governo já conta com R$ 26 bilhões decorrentes da privatização da Eletrobras e R$ 18 bilhões de dividendos do BNDES. O banco de fomento pagou esse valor decorrente de lucros apurados em 2020 e 2021, antes de receber o ofício com o pedido do governo.
Na avaliação do economista do ICL, André Campedelli, as tentativas de obtenção de receitas imediatas para os gastos com o Auxílio Brasil e benefícios para taxistas e caminhoneiros mostra, mais uma vez, o desespero do governo em melhorar sua imagem antes do período eleitoral, visando aos votos. “Isso não deve gerar problemas fiscais, mas talvez sinalize que os gastos do governo tenham uma forte queda a partir de outubro, com o final do período eleitoral”, explica.
Ademais, o economista explica que a política de redução dos combustíveis, via ICMS, ganha uma nova explicação. “Além dela ser preferível para o governo, pois não afeta os dividendos pagos aos acionistas, mantém a margem de lucro inalterada da empresa, permitindo, caso a antecipação realmente se efetive, que o governo se beneficie também”, explica Campedelli.
Antes criticados, dividendos da Petrobras devem ajudar o governo a pagar a conta extra
As empresas estatais têm ampliado seus lucros desde o ano passado. No caso da Petrobras, porém, esse lucro é criticado pelo próprio Executivo. O presidente Jair Bolsonaro, por exemplo, já disse que a estatal está “gorda e obesa”. A Petrobras já injetou nos cofres federais R$ 447 bilhões de 2019, início do governo Bolsonaro, a março deste ano, conforme dados dos relatórios fiscais da companhia.
No mês passado, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse, em evento de aniversário do BNDES, que o banco havia dado uma “rasteira” no governo, e cobrou a devolução de recursos que foram repassados pelo Tesouro Nacional à instituição para viabilizar empréstimos. Essa devolução, porém, não impacta o resultado das contas públicas e não se trata de um repasse de dividendos.
O ministro também já havia dito que usaria dinheiro de dividendos e de privatizações para custear os novos benefícios distribuídos, criados ou ampliados em pleno ano eleitoral. Só neste ano, a expectativa é de que a União receba mais de R$ 30 bilhões em dividendos da Petrobras.
O movimento é feito após reações negativas do mercado sobre a emenda que liberou o pagamento fora das principais regras sobre as contas públicas — como a meta fiscal (resultado de receitas menos despesas a ser perseguido pelo governo), o teto de gastos (que impede o crescimento real das despesas federais) e a necessidade de compensações orçamentárias.
Em 2021, as empresas estatais federais pagaram R$ 101 bilhões a título de dividendos e juros sobre capital próprio relativos a anos anteriores e antecipação por conta do resultado do próprio exercício. Desse total, R$ 43 bilhões foram destinados à União, sendo que 98% desse valor foi proveniente dos grupos Petrobras (R$ 21,1 bilhões), BNDES (R$ 13,6 bilhões), BB (R$ 3,2 bilhões), Caixa (R$ 2,8 bilhões) e Eletrobras (R$ 1,3 bilhão).
Segundo economistas consultados, o governo tem reduzido impostos recorrentemente. Agora, tenta usar as estatais para aumentar seu caixa. Para alguns, seria inconsistente enquanto política reduzir impostos e cobrar receitas de dividendos. Além de interferir na governança das empresas, esse processo aumenta as incertezas no mercado.
O mandato do presidente Jair Bolsonaro deve ser encerrado com uma despesa total no ano de 18,9% do PIB (Produto Interno Bruto), patamar inferior aos 19,3% registrados em 2018, ano de encerramento da gestão anterior.
Ainda assim, a expectativa do governo é encerrar 2022 com um déficit primário próximo de zero ou um superávit, no que poderia ser o primeiro saldo positivo das contas federais após oito anos.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias