O orçamento secreto estaria por detrás do descontentamento do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), com o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Recentemente, Lira reclamou, em entrevistas à imprensa, da articulação política do governo, sem dizer o real motivo de seu descontentamento. Mas, ontem (5), em reunião com o presidente Lula, Lira deixou claro que as emendas de relator RP9, nome técnico do orçamento secreto, usado sem limites pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para comprar o apoio do Congresso, era o motivo.
As declarações de Lira contra a articulação política do governo fizeram com que Lula chamasse o presidente da Câmara para um café da manhã no Palácio da Alvorada na segunda-feira. Quando a Câmara aprovou a MP (Medida Provisória) dos ministérios horas antes de a proposta de Lula caducar, Lira deu declarações de que, a partir dali, o governo teria que “andar com as suas pernas”.
Lula quis então ouvir do próprio Lira o que significava a declaração. E, segundo o blog da jornalista Malu Gaspar, de O Globo, no encontro o petista ouviu do presidente da Câmara diversas vezes a sigla RP2, que são as chamadas emendas de bancada ou emendas dos ministérios, que englobam R$ 9,8 bilhões e faziam parte do orçamento secreto, quantia que era gasta sem critérios, como citou Malu Gaspar em seu blog. “Bastava o parlamentar indicar para onde queria que o dinheiro fosse enviado, desde que fosse gasto de acordo com a atribuição referente à pasta”, escreveu.
Cabe lembrar que era Lira, líder do grupo político chamado centrão, quem tinha as mãos na torneira do orçamento secreto no governo Bolsonaro. Mas, no fim do ano passado, após o STF (Supremo Tribunal Federal) julgar as emendas de relator como inconstitucionais, a dinâmica da liberação desses recursos mudou.
Este montante foi transformado nas chamadas emendas RP2 e repassado para os ministérios de Lula na PEC da Transição, aprovada em dezembro. Nessa configuração, caberia a cada pasta a definição de como o dinheiro deveria ser aplicado.
Segundo a jornalista Malu Gaspar, a revolta expressada por Lira foi desencadeada por uma portaria editada pela ministra da Saúde, Nísia Trindade, no começo de maio, que definiu critérios técnicos para a destinação de pouco mais de R$ 3 bilhões em emendas discricionárias repassadas para a pasta pela PEC da Transição, para “assegurar que a verba do SUS [Sistema Único de Saúde] seja aplicada de forma transparente e sistematizada”.
Para liberar esses recursos à área da saúde, é preciso que estados, municípios e autoridades do Distrito Federal elaborem propostas, ou seja, há critérios muito claros, o que não acontecia na época do orçamento secreto.
Agora, emendas devem ser mediadas pelos ministérios e com transparência, bem diferente do que ocorria com o orçamento secreto
Com o dinheiro público das emendas RP9, que não respeitavam o princípio da transparência e da distribuição igualitária de recursos, fez-se uma farra nos currais eleitorais dos então aliados do ex-presidente Bolsonaro e do próprio Arthur Lira.
Conforme o blog apurou, Lira e os líderes de bancada estão descontentes com a nova dinâmica de distribuição de recursos, porque não têm mais o controle.
No caso da portaria do Ministério da Saúde, ela prevê que o dinheiro seja aplicado prioritariamente na atenção primária, na especializada e em situações de emergência, tudo mediado pela pasta e com a devida publicidade, o oposto do que ocorria com o orçamento secreto.
A portaria teria impactado diretamente as emendas esperadas por parlamentares às vésperas da votação de projetos importantes para o Palácio do Planalto, como o arcabouço fiscal e a própria MP dos ministérios, o que teria causado irritação em Lira.
Como a liberação dessas verbas depende agora dos ministérios, Lira e aliados têm reclamado da articulação do governo (leia-se o ministro da Casa Civil, Rui Costa), que estariam dificultando a liberação dos recursos.
Esse teria sido o motivo de Lira e lideranças da Câmara, como o relator da MP dos ministérios, o deputado Isnaldo Bulhões, terem articulado retaliar o governo na votação da medida, que desidratou os ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas, e recriou a Funasa, como queria o centrão.
Redação ICL Economia
Com informações de O Globo