Enquanto o governo elabora um pacote de corte de gastos devido à intensa pressão do mercado financeiro, o sistema previdenciário dos militares brasileiros, que inclui o pagamento de pensões a filhas solteiras e “morte fictícia”, tem uma conta que não fecha. Dados do TCU (Tribunal de Contas da União) mostram que cada militar pesa 17 vezes mais no déficit da Previdência do que os aposentados do Regime Geral do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).
Em maio, o ministro Bruno Dantas, presidente do TCU, disse, em entrevista à Folha de S.Paulo, que o Brasil vai precisar realizar mudanças na Previdência. Embora diga que a decisão seja do governo, ele mostrou, com base em números do órgão, a discrepância existente no déficit previdenciário dos militares em relação aos demais.
Dantas explicou que, enquanto o déficit per capita (por beneficiário) do setor privado, no INSS, é de R$ 9,4 mil e o dos servidores civis chega a R$ 69 mil, nas contas dos militares o valor alcança R$ 159 mil. Os valores são do ano passado.
O regime de aposentadorias e pensões das Forças Armadas, chamado de sistema de proteção dos militares, é composto do seguinte:
- Pensões dadas para filhas solteiras;
- Pagamentos em razão da chamada “morte ficta” (ou “morte fictícia”), que é quando o militar é punido, mas a família recebe uma pensão como se ele tivesse morrido; e
- Dinheiro que os integrantes das Forças Armadas recebem quando saem da ativa.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pediu a inclusão do Ministério da Defesa no pacote de corte de gastos. Anteontem (12), ele se reuniu com o chefe da pasta, José Múcio Monteiro, para tratar do assunto. Ontem (13), Múcio se reuniu com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e técnicos da pasta.
O pagamento de pensões a filhas de militares solteiras chegava a R$ 117 mil mensais, em alguns casos, em 2021, segundo reportagem do Estadão.
Projeções do TCU indicam que, até 2060, o governo ainda arcará com esse custo.
Inclusão da defesa no corte de gastos desagrada a militares
O tema desagradou e causou revolta na cúpula das Forças Armadas. O senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS), ex-vice-presidente e general da reserva do Exército, foi à rede X (antigo Twitter) criticar o governo.
Mourão escreveu: “O Governo Lula estoura mais ainda as contas da Previdência Social ao conceder aumento real para o salário-mínimo, que não é mínimo. Agora resolve querer atacar o Sistema de Proteção Social dos militares, querendo apresentá-lo como o vilão dessa estória”.
Reportagem do Estadão aponta que os dados do TCU serviram como base para assessores de Lula começarem a defender mudanças na área.
A medida também ajudaria Lula a “vender” o pacote, que passaria a conter reduções em uma categoria considerada “privilegiada”, e não apenas cortes em áreas sociais. “Considerando a profundidade das alterações nos regimes previdenciários, promovidas nas últimas duas décadas, verifica-se que os militares das Forças Armadas foram os que preservaram as maiores vantagens”, afirmou o ministro Walton Alencar Rodrigues durante a análise das contas presidenciais, em junho.
Em valores absolutos, o déficit total da Previdência foi de R$ 428 bilhões em 2023. Isso acontece porque há um desequilíbrio entre o que se arrecada de contribuição dos trabalhadores formais da ativa do que o que se paga para aposentados e pensionais.
A conta é composta pelo seguinte:
- Déficit de R$ 315,72 bilhões no INSS;
- Déficit de R$ 54,78 bilhões no regime dos servidores civis;
- Déficit de R$ 49,73 bilhões nas Forças Armadas; e
- Déficit de R$ 8,03 bilhões no Distrito Federal, que incorpora policiais e bombeiros de Brasília bancados pela União.
O resultado negativo dos militares é menor em termos totais, mas supera em proporção ao número de integrantes. Quando o INSS banca seus custos com 65% de arrecadação própria, os militares contribuem com apenas 15,47% da despesa de sua previdência, ou seja, o governo tem que cobrir o rombo com mais recursos de impostos federais que poderiam ir para outras áreas.
Redação ICL Economia
Com informações de O Estado de S.Paulo