A Câmara dos Deputados pode votar nesta terça-feira (2) o parecer preliminar do PL das Fake News (Projeto de Lei 2.630/20), que institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet. No entanto, o caminho para a votação não deve ser fácil. Durante o fim de semana, big techs como Google e Twitter realizaram uma campanha ostentiva de desinformação contra a proposta, provocando a reação imediata de instituições democráticas.
Na semana passada, os deputados aprovaram o regime de urgência do PL das Fake News no que foi considerado uma derrota pelas alas conservadoras da Casa. Ainda resta dúvida, contudo, sobre se há consenso entre líderes partidários para que o PL das Fake News seja de fato chamada para votação. O presidente da Casa, Arthur Lira, convocou para hoje uma reunião de líderes para medir a temperatura sobre se há ou não uma disposição para aprovação do PL das Fake News.
Ministério Público Federal, Ministério da Justiça e senadores anunciaram medidas para apurar a conduta das plataformas ante a possibilidade de terem de assumir compromissos e procedimentos para conter a disseminação de fake news e discursos de ódio em seus serviços.
O ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB), anunciou em entrevista coletiva nesta terça-feira (2) que a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacom) tomou uma medida cautelar relativa ao Google referente ao PL das Fake News. Desde segunda-feira (1), a plataforma exibe em sua página inicial uma mensagem contra o Projeto de Lei 2630/2020, conhecido como PL das Fake News. O buscador terá até duas horas para fazer os ajustes necessários.
Para Dino, o Google se define como uma plataforma de tecnologia e não pode publicar um “editorial”. Sendo assim, no entendimento do ministro, o aviso exibido pelo buscador deve ser considerado publicidade e, portanto, precisa ser sinalizado como tal.
A Senacom avaliou que o aviso se trata de propaganda abusiva e, assim, necessita de contra-propaganda. Desta forma, a empresa deve veicular um aviso a favor do PL, para que o consumidor tenha acesso ao “outro lado”.
O MPF questionou oficialmente o Google sobre as razões para a plataforma de pesquisas na internet exibir em sua página de abertura, desde a tarde de segunda-feira (1), a mensagem: “O PL das Fake News pode aumentar a confusão sobre o que é verdade ou mentira no Brasil”. O clique no link leva o internauta a uma página com um artigo contra o projeto de lei, assinado pelo diretor de Relações Governamentais e Políticas Públicas do Google Brasil, Marcelo Lacerda.
Segundo relato do grupo Sleeping Giants Brasil, conhecido por expor digitalmente empresas que cometem abusos e crimes no mundo digital, o Google estaria usando a própria plataforma para atacar o PL, enquanto que o Twitter estaria deslogando as contas de usuários que se manifestam em favor da regulação das redes sociais, dificultando a navegação.
“Nosso objetivo é proteger os consumidores e combater a censura privada. A regulação não é uma proposta do governo, é uma exigência do nosso tempo. Não só é amparada pela Constituição, mas exigida pela Constituição”, afirmou Dino.
O PL das Fake News estabelece obrigações a serem seguidas por redes sociais, aplicativos de mensagens e ferramentas de busca na sinalização e retirada de contas e conteúdos considerados criminosos. A relatoria do projeto, que é do Senado, é do deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), que também se manistou sobre a investida das big techs. Ele chamou a ação de “sórdida e desesperada” para impedir a votação do texto. “Vamos à luta vencer a batalha contra a mentira e o jogo sujo das big techs!”, disse o deputado em sua conta no Twitter.
PL das Fake News: Eduardo Moreira diz que monopólio das big techs gera riscos “muito mais perigosos do que as pessoas podem imaginar”
“[O]Google, essencialmente, sabe o que você estava pensando. E sabe também (o que você pensou) no passado. Quando você tem algum pensando sobre algo, quer saber algum detalhe, você busca no Google. Sites que tem Google Adds, que na verdade são todos os sites, registram sua visita. Portanto, o Google sabe todos os sites que você visitou, tudo o que você buscou, se você usou gmail ou email. Então ele te conhece melhor que você mesmo.”
A fala acima é do ativista australiano Julian Paul Assange, programador de computador, jornalista e fundador do site WikiLeaks, que ganhou atenção internacional em 2010 quando o site criado por ele publicou uma série de documentos sigilosos do governo dos Estados Unidos. Está reproduzida na coluna desta terça-feira do colunista do UOL e do ICL Notícias Jamil Chade, que o entrevistou há alguns anos.
O economista e fundador do ICL, Eduardo Moreira, seguiu a mesma linha de raciocínio na edição de hoje do ICL Notícias. Na avaliação dele, essas empresas representam “o maior risco de todos (…), que diz respeito a 100% das pessoas que vivem no planeta”. “O Google tem monopólio do mercado de buscas, o Facebook monopólio de redes sociais, o LinkedIn, de carreiras, o WhatsApp, de mensagem. O Google é a porta de entrada de todo mundo que entra na rede. A penetração do Google em buscas é de 96,27%”, disse Moreira.
Ainda segundo ele, 97,7% da receita do Facebook vem de propaganda e 80% da receita do Google vem de propaganda. “Depois que [essas redes] categorizam as pessoas, precisam que elas aumentem a interação entre elas, o número de vezes que buscam, diálogo uma com a outra, e qual o assunto mais faz pessoas se interessarem/agirem entre elas”, explicou Moreira, abordando as razões sobre o porquê essas empresas fazem campanha contra o projeto, que coloca em risco esses monópolios.
A deputada Sâmia Bonfim (PSOL-SP), que também abordou o assunto na edição de hoje do ICL Notícias, vem defendendo nas redes sociais a importância desse tema. Para ela, diante da campanha de desinformação que o PL vem sofrendo, fica difícil saber se será possível aprovar o projeto esta semana.
A proposta, que vem sendo discutida há três anos, estabelece uma série de obrigações a serem seguidas pelas empresas de tecnologias, como a criação de mecanismos para que usuários denunciem conteúdos potencialmente ilegais e o pagamento de multa de até R$ 1 milhão por hora em caso de descumprimento de decisão judicial para a remoção de conteúdo ilícito.
“A multa prevista no PL é baixíssima para o quanto essas empresas faturam. O lobby delas tem sido forte para que possam seguir lucrando com o crime, monetizando discurso ódio, fake news. Não duvidaria que não consigamos votar e, quanto mais tempo se perde, mais difícil fica aprovar [a proposta]”, disse.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias, do UOL e da Rede Brasil Atual