As exceções incluídas na reforma tributária no Senado desvirtuaram um dos principais pilares do texto, que era promover a transição energética em benefício do meio ambiente. Isso porque os benefícios incluídos no relatório do senador Eduardo Braga (MDB-AM) miram alguns dos setores mais poluentes do país, como o agronegócio, a cadeia automotiva e o setor de aviação.
Somente o agronegócio responde por 74% do total de emissões de gases de efeito estufa no país.
A preocupação de especialistas é que as isenções ou alíquotas diferenciadas passarão a fazer parte da Constituição, o que dificulta possíveis alterações.
Essa revisão periódica das exceções foi elogiada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para quem a regra possibilita reduzir os benefícios futuramente.
Aprovada pelo Senado no último dia 8 de novembro, a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 45/19 será apreciada agora na Câmara, para aonde voltou, após aprovação em julho passado, devido às mudanças feitas no Senado.
Quando estava tramitando na Câmara, uma das inclusões dos deputados foi a defesa ambiental entre os pilares do sistema tributário brasileiro.
A redação aprovada no Senado diz que “o Sistema Tributário Nacional deve observar os princípios da simplicidade, da transparência, da justiça tributária e da defesa do meio ambiente”.
Reforma tributária: incluir pilar ambiental no texto é ganho, mas benefícios a poluidores correspondem a uma contradição
Aquele trecho é visto por ambientalistas e tributaristas como grande avanço na reforma, uma vez que se trata de uma PEC e, portanto, a redação estará na Constituição. E, se a Carta Magna determina que o sistema tributário brasileiro tem como pilar a defesa do ambiente, leis que vão na direção contrária a essa defesa podem ser consideradas inconstitucionais.
“É positivo instituir esses princípios constitucionais de preservação ambiental porque isso quer dizer que, se alguém quiser questionar a preservação ambiental de agora em diante, vai ter de questionar a Constituição”, disse Tatiana Falcão, consultora em tributação ambiental, à Folha de S.Paulo. Ela participou de discussões no Senado sobre a reforma.
Mas, vale ressaltar, as exceções, caso a Câmara acate as mudanças feitas pelos senadores, também estarão na Constituição, o que dificultará possíveis questionamentos.
Além de unificar os impostos existentes em dois – a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), de esfera federal, e o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), de competência estadual -, a reforma cria também o IS (Imposto Seletivo), o chamado “imposto do pecado”, sobre itens que fazem mal à saúde e ao meio ambiente.
O IS era tido por vários ambientalistas como o embrião da taxação de carbono no Brasil, mas a lista mantida por Braga pode frustrar essa possibilidade.
O relator da reforma no Senado voltou atrás horas depois de apresentar o relatório e manteve a lista de setores que não poderão ser alvo do imposto seletivo. Ainda no final de outubro, o parlamentar havia afirmado que retiraria do texto a lista criada na Câmara.
Entre os setores beneficiados estão os alimentos destinados ao consumo humano, o que pode englobar todos os tipos de alimentos, inclusive os não saudáveis, além de produtos e insumos agropecuários, como os agrotóxicos.
Entidades lançam manifesto por reforma mais saudável, solidária e sustentável
Na semana passada, 130 organizações da sociedade civil signatárias do movimento Reforma 3S (Saudável, Solidária e Sustentável) lançaram um manifesto contra esse dispositivo em entrevista coletiva no Salão Verde da Câmara.
Entre as exceções incluídas pelo Senado, está um limite de 1% do valor do mercado para a taxação de bens oriundos direto da extração (mineração e petróleo). O valor é irrisório, se comparado àquele que seria posto em caso de uma eventual taxação de carbono no país.
“A reforma tributária está eivada de contradições, sobretudo penalizando a perspectiva ambiental do país e seus compromissos ambientais. É muito preocupante porque isso é o que vai ordenar a economia política do país nas próximas décadas”, disse Marcos Woortmann, coordenador de política socioambiental do IDS, segundo a Folha.
Entre as contradições da reforma também está a manutenção do incentivo dado às montadoras e fabricantes de veículos movidos à combustão nas regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste. A princípio, o benefício seria concedido, até 2032, a modelos híbridos ou 100% elétricos, mas de última hora o Senado o ampliou.
Contudo, o Senado também incluiu no texto o IBS ecológico, pauta antiga dos ambientalistas. Nesse caso, 5% da distribuição financeira aos municípios precisarão levar em conta indicadores de preservação ambiental criados por lei.
O texto também define que, sempre que possível, a concessão dos incentivos regionais por meio de isenções de tributos federais considerará critérios de sustentabilidade ambiental e redução das emissões de carbono.
Se a PEC for aprovada dessa forma, será a primeira vez que o termo “emissões de carbono” aparecerá na Constituição. O trecho também vale para a distribuição dos R$ 60 bilhões do FDR (Fundo Nacional do Desenvolvimento Regional).
Ou seja, apesar das críticas, há aspectos positivos, principalmente porque, pela primeira vez, a reforma coloca a defesa ao ambiente como princípio do sistema tributário brasileiro e favorece municípios que cumprirem legislações ambientais.
Também cria um Fundo de Sustentabilidade e Diversificação Econômica do Estado do Amazonas e insere a redução de emissões de carbono na Constituição.
Redação ICL Economia
Com informações da Folha de S.Paulo