Cenário externo para segundo semestre é menos favorável para as exportações, aponta Ibre FGV

Os possíveis impactos negativos com as turbulências na China e Argentina poderão impactar as exportações já esse ano
22 de agosto de 2023

O saldo da balança comercial foi de US$ 8,9 bilhões em julho, um aumento de US$ 3,5 bilhões em relação a igual período de 2022. No acumulado do ano até julho, o superávit foi de US$ 53,6 bilhões, superior em US$ 13,9 bilhões ao do acumulado do mesmo período em 2022. O resultado do acumulado de julho de 2023 foi o maior na série histórica iniciada em 1998. O Relatório Focus do Banco Central de 21 de agosto projeta um saldo comercial de US$ 71,70 bilhões, um aumento de US$ 4,14 bilhões, se comparado com a estimativa de quatro semanas anteriores.

A melhora no valor do superávit está associada ao aumento do volume exportado e ao recuo no volume importado, pois os preços caíram para os dois fluxos. O volume exportado cresceu 13,3% e o importado caiu 5,3%, na comparação interanual do mês de julho entre 2022 e 2023; e os preços recuaram 14,7% (exportações) e 13,6% (importações), levando a uma queda, em valor, de 3,1% para as exportações e 18,2% nas importações.

No acumulado até julho, o mesmo comportamento se repete: volume exportado cresce, o importado recua e os preços caem, embora as variações sejam menores que na comparação mensal. Em termos de valor, as importações recuaram em 8,8% e as exportações aumentaram 0,1%.

Os resultados para as exportações dependem principalmente do desempenho das commodities, que explicam cerca de 70% das vendas externas do país. Na comparação mensal, o volume exportado foi de 16,8% e na do acumulado do ano até julho de 9,8%. Os preços caíram na base mensal (-17,0%) e na do acumulado do ano (-8,6%). O volume das não commodities caiu 1,1% entre os meses de julho e cresceu 0,6% entre os acumulados do ano até julho.

No caso das importações, predominam as não commodities, com participação ao redor de 90% das compras brasileiras do exterior. O aumento do volume das commodities importadas na base mensal (+1,9%) ou na acumulada até julho (+11,4%)  têm pouca relevância perto da queda das importações das não commodities:   -6,2% (mensal) e -2,5% (no acumulado até julho). Em adição, o recuo nos preços importados das commodities superou a variação positiva dos volumes dessas, enquanto o das não commodities reforçou a tendência de queda.  O resultado final, como já mencionado, foi a queda no valor das importações

Quais são as possíveis tendências das exportações para os próximos meses?

Vamos supor uma relativa estabilidade na taxa de câmbio ao redor de R$/US$ 4,8 e R$/US$ 5,2. No caso dos preços, os índices de preços das exportações e importações têm apresentado comportamento similar com tendência de queda. Como resultado desse comportamento, os termos de troca registram pouca variação. Entre julho de 2022 e 2023, eles recuaram 1,3% e a variação foi nula na comparação entre os acumulados do ano até julho. Até o final do ano não se esperam grandes variações nos preços, com uma possível tendência de alta no petróleo.

A demanda externa comanda o comportamento das exportações: a China lidera com 30,3% das vendas brasileiras, seguida pelos Estados Unidos, com 10,5% e a Argentina com 5,7%. Em 2022 (jan-julho), o superávit com a China explicou 55% do saldo positivo da balança comercial, e em 2023 (jan-julho), 54%. Com os outros dois principais parceiros, o resultado também foi de melhora com a redução do déficit com os Estados Unidos e a melhora do superávit com a Argentina, mas a dependência com a China não mudou. Em termos de valor, as exportações só cresceram para a China (+6,9%) e Argentina (+24,5%);  já as importações recuaram para todos os mercados, exceto União Europeia.

A análise por volume exportado mostra variação positiva para todos os mercados, exceto União Europeia e Demais da América do Sul. A liderança na variação é da China, seja na comparação mensal (+39,8%) ou no acumulado do ano (+24,8%). Em seguida: a Argentina, mensal (+18,6%) e acumulado no ano (+20,9%); e os Estados Unidos, mensal (+18,1%) e acumulado do ano (+5,2%).

O quadro da economia chinesa preocupa com o viés de baixa nas projeções de crescimento do país, influenciada com a redução dos investimentos em construção, queda nas exportações e deflação, o que sinaliza a fraca demanda doméstica. Ressalta-se, porém, que as estimativas de um crescimento do PIB ao redor de 5% já era a estimativa oficial do governo chinês. Há um relativo consenso entre as análises sobre os possíveis impactos sobre as exportações brasileiras. As exportações da agropecuária seguiriam o comportamento sazonal esperado, com desaceleração do crescimento no segundo semestre. Observa-se que o principal produto de exportação, a soja em grão, com participação de 45% nas exportações para a China, no acumulado do ano até julho aumentaram 12,3% em relação a igual período de 2022. Houve queda nas exportações de carne bovina devido a um embargo temporário pelas autoridades chinesas, mas em compensação as carnes de aves cresceram 42%, com participação de 1,8%. Observa-se que as tensões da China com os Estados Unidos, um concorrente brasileiro na agropecuária, beneficiam o Brasil.

O principal efeito negativo seria no minério de ferro, associado aos investimentos em construção, mas estas já vêm caindo com recuo de 9,1%, no acumulado do ano, e participação na pauta de 17% (3º principal produto exportado). O segundo principal produto exportado, o petróleo bruto (18% de participação), registrou aumento de 19,8%. No ano de 2022, o desempenho foi pior com o desvio das compras brasileiras pelos chineses a favor da Rússia. Vale ressaltar as venda de celulose que cresceram 34,6%, com participação de 3,9%. Se o fim do lockdown da COVID 19 não trouxe um boom de vendas, os resultados não deixaram de ser positivos. A questão fica para o desempenho em 2024.

A segunda fonte de preocupação é a Argentina. Destaca-se o aumento das exportações para o país, mesmo com a recessão da economia. Até julho, as exportações de automóveis e peças continuavam crescendo e responderam por 19% das exportações brasileiras para a Argentina. A seca no país introduziu um novo produto na pauta: a soja em grão, com participação de 16% no acumulado até julho. No ano de 2022, as exportações de soja foram de US$ 181 milhões e em 2023, até julho, de US$ 1,7 bilhões. Já era esperado que esse cenário mudasse com a desaceleração das vendas do setor automotivo e a volta paulatina da regularização do plantio de soja.

As turbulências associadas ao período eleitoral, porém, levaram a uma piora do cenário econômico com medidas de proteção cambial. Não se espera que a contribuição da Argentina para o aumento do volume exportado se sustente nos próximos meses. Quanto às especulações sobre uma possível vitória do candidato que programa a dolarização da economia argentina, esse não seria o principal problema, pois a maior parte do comércio é realizada em dólares e/ou são transações intra-firmas. O maior impacto poderá advir da promessa de saída da Argentina do Mercosul, com perda do acesso preferencial de mercado, além de criar um cenário de instabilidade e incertezas quanto aos possíveis acordos negociados com outros países, como o acordo Mercosul-União Europeia.

Nos Estados Unidos, a projeção do Fundo Monetário Internacional é de um crescimento de 1,8% em 2023, após um crescimento de 2,1% em 2022. No entanto, as exportações em volume cresceram para esse país, lideradas pelas vendas de semi-manufaturas de ferro e aço (15%), petróleo bruto (11%), ferro gusa (4,8%), aeronaves (4,5%), instalações e equipamentos de engenharia civil (4,4%), entre outros. A pauta para os Estados Unidos é a mais diversificada entre os 3 principais mercados. Com a expectativa de redução da demanda com aumento da taxa de juros, é esperado um cenário menos favorável para as exportações brasileiras.

Em suma, até o final do ano se espera um menor ritmo de crescimento nas exportações. No caso das importações, a principal variável é a demanda doméstica. Nesse caso, as análises como a do Monitor do PIB FGV divulgada pela FGV IBRE sinalizam um cenário com baixa taxa de investimento, endividamento das famílias e juros ainda altos que não propiciam um quadro de aceleração do crescimento econômico.

As expectativas desfavoráveis para uma aceleração das importações são confirmadas pela redução das importações de bens intermediários na agropecuária e na indústria. No caso dos investimentos, o destaque é o aumento de 45,6% das compras de bens de capital pela agropecuária no acumulado até julho, mas em julho o recuo nas importações (-7,0%) sinaliza que as demandas do setor já estariam atendidas. Para a indústria, os percentuais de crescimento de 3,0% (mensal) e 10,0% (acumulado) não sustentam a elevação da Formação Bruta de Capital do setor como um todo, que depende da melhora do componente doméstico.

A evolução dos preços e volume por setor de atividade das exportações e importações segue a tendência já observada nos meses anteriores. Aumento no volume exportado da agropecuária e da extrativa, queda nos preços e pequena variação na indústria de transformação. Nas importações, é registrado o recuo em todos os preços e volumes, exceto o aumento no volume, em 17,1% entre os meses de julho, para a indústria extrativa, influenciado pelo variação em 48,7% na quantidade em toneladas.

Do portal Ibre FGV

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