O projeto do novo arcabouço fiscal, que teve seu pedido de urgência aprovado ontem (17) na Câmara dos Deputados com vantagem maior que a esperada, permite a ampliação das despesas do governo federal para algo em torno de R$ 80 bilhões nos próximos dois anos. A estimativa é do mercado financeiro, que avaliou dois dispositivos incluídos no texto pelo relator, o deputado federal Cláudio Cajado (PP-BA). Contudo, de acordo com técnicos que assessoram o parlamentar, o valor é cerca de metade do que projeta o mercado, e estaria, na verdade, na casa dos R$ 42 bilhões.
Em 2024, primeiro ano de validade do novo marco fiscal, que substitui o teto de gastos (regra que limitava o aumento de gastos do governo à inflação do período anterior), o governo poderá ampliar as despesas primárias no limite máximo permitido pela nova regra: 2,5% acima da inflação. A permissão de gastos do novo arcabouço fiscal tem como um de seus pilares a regra de que as despesas devem crescer entre 0,6% e 2,5% acima da inflação a cada ano.
O dispositivo incluído por Cajado não constava do texto original elaborado pela equipe econômica do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A inclusão do mecanismo foi fruto de negociação entre o relator e o governo.
O governo aceitou negociar desde que o relator deixasse de fora dos mecanismos que visam endurecer as regras, em caso de não cumprimento das metas por parte do governo, a nova política de valorização do salário mínimo e o Bolsa Família.
Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, Cajado disse que os dispositivos foram incluídos para compensar os efeitos da desoneração dos combustíveis em 2022, no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que baixaram a inflação temporariamente, afetando o cálculo do indicador este ano.
“No governo anterior, houve uma diminuição da receita pela desoneração dos combustíveis. Então, a receita que você está calculando de junho do ano passado a julho deste ano será impactada pela queda da receita. Além disso, houve uma deflação por conta dessa desoneração. Nós calculamos que isso daria os R$ 40 bilhões, que estamos acrescendo para o ano de 2024, na largada”, disse Cajado ao Estadão.
Cálculos feitos pelo ex-secretário do Tesouro Nacional, Jeferson Bittencourt, economista da gestora ASA Investments, e mostradas na reportagem do Estadão, apontam que a medida pode fazer com que o governo ganhe uma folga de R$ 40 bilhões no primeiro ano de vigência da regra fiscal. “De uma maneira direta, é incluído na regra que a despesa em 2024 não crescerá pelo piso [0,6%], mas pelo teto. Tem aí 1,9% de crescimento das despesas que já é definido extra-regra“, afirmou.
A votação do pedido de urgência permite que a proposta seja votada diretamente no plenário da Câmara dos Deputados, na próxima quarta-feira (24), sem passar pelas comissões temáticas.
Arcabouço fiscal: dispositivo permite inclusão de crédito suplementar gerado em 2024 a partir da inflação
Outro dispositivo incluído pelo relator na proposta do arcabouço abre a segunda brecha, que permite ampliação de gastos em R$ 40 bilhões em 2025, conforme cálculos de Bittencourt. Esse dispositivo permite que, naquele ano, seja incorporado à base de gastos um crédito suplementar gerado em 2024 a partir da inflação do segundo semestre de 2023. Isso porque Cajado alterou o cálculo da inflação que vai corrigir o limite de gastos.
Conforme previsto na proposta, o novo arcabouço fiscal prevê que as despesas sejam corrigidas em 70% do aumento da arrecadação nos 12 meses encerrados em junho do ano anterior. A variação da inflação de julho a dezembro deverá ser incorporada aos gastos do governo, segundo a regra, por meio de um crédito suplementar.
Segundo Bittencourt disse ao Estadão, o texto de Cajado diz que o crédito suplementar do diferencial de inflação não pode ser incorporado ao limite despesas, com exceção de 2025. “O diferencial de inflação que será verificado entre o acumulado de 12 meses até junho deste ano e o final do ano, vai ser incorporado de maneira definitiva a partir de 2025″, explicou.
Trocando em miúdos, nas palavras do ex-secretário do Tesouro, isso representará um gasto adicional pelo segundo ano seguido, uma vez que os economistas projetam que a inflação ao fim do ano de 2023 deverá ser superior ao calculado até junho.
Por outro lado, a proposta do relator força a gestão fiscal a entregar as metas, embora os incentivos para que esse objetivo seja atingido tenha sido atenuado pelos dois dispositivos.
Porém, os cálculos dos técnicos da Câmara mostram que a ampliação de despesas na largada do arcabouço fiscal ocorreria apenas em 2024, com a incorporação dos valores extras na base. A partir daí, seriam apenas correções do valor ampliado.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias e de O Estado de S.Paulo