Cálculos do Ministério da Fazenda apontam que as exceções incluídas por parlamentares na proposta de reforma tributária sobre o consumo reduzem para 63% o potencial de arrecadação em relação ao texto original. A PEC 45/19, que está na Câmara dos Deputados, foi desfigurada, principalmente no Senado, para atender a lobbies de setores específico.
A estimativa foi feita pela Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda. Entre as exceções estão o Simples Nacional, que distribui benefícios para empresas de porte bem maior do que em outros países do mundo, e a Zona Franca de Manaus (ZFM).
Além disso, as mudanças feitas no Senado incluíram regimes diferenciados de cobranças para determinados setores, que serão regulamentados somente em 2024, entre os quais estão: combustíveis e lubrificantes; serviços financeiros, operações com bens imóveis, planos de assistência à saúde e concursos de prognósticos (como as loterias) cooperativas; serviços de hotelaria, parques de diversão e parques temáticos, bares, agências de viagens e turismo e restaurantes e aviação regional; missões diplomáticas e representações de organismos internacionais; entre outros.
Outros setores da economia pagarão 40% da alíquota padrão, que será cobrada de todos os segmentos da economia e que também será regulamentada por lei complementar. Entre eles estão serviços de educação; de saúde; dispositivos médicos; dispositivos de acessibilidade para pessoas com deficiência; medicamentos; produtos de cuidados básicos à saúde menstrual; serviços de transporte coletivo de passageiros rodoviário e metroviário de caráter urbano, semiurbano e metropolitano; entre outros.
Há ainda segmentos que podem ficar isentos de cobrança, em decisão que também será definida por lei complementar, como produtos hortícolas, frutas e ovos; aquisição de medicamentos e dispositivos médicos pela administração pública e entidades de assistência social; serviços de educação de ensino superior nos termos do Prouni (Programa Universidade para Todos); automóveis de passageiros comprados por pessoas com deficiência e pessoas com transtorno do espectro autista, e por motoristas profissionais que destinem o automóvel à utilização na categoria de aluguel (táxi), entre outros.
O relator também propôs que os profissionais liberais, como advogados, engenheiros e contadores, por exemplo, tenham uma alíquota diferenciada, menor do que a tributação geral de todos os setores. Essa tributação seria de 70% do valor da alíquota geral.
No entanto, o levantamento da Fazenda observou que a capacidade de arrecadação do país estaria acima da média dos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), formada por nações desenvolvidas, que é de 58%.
O potencial arrecadatório do Brasil ficaria abaixo de países como Nova Zelândia, Luxemburgo e Chile, mas superaria a de nações como Hungria, Portugal, Espanha e Reino Unido.
Mas vale lembrar que, em outros países, a carga tributária sobre o consumo é menor, pois as nações mais desenvolvidas costumam taxar mais renda e o patrimônio, focando nos ricos, como já mostrou no ICL Notícias o economista e fundador do ICL (Instituto Conhecimento Liberta), Eduardo Moreira.
Apesar das exceções, reforma tributária coloca o Brasil com capacidade de arrecadação acima dos países da OCDE
A PEC 45/19 foi aprovada pelo Senado e voltou para a Câmara dos Deputados, onde já havia sido aprovada em julho.
Desde o início da tramitação, o secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já davam sinais de preocupação com as mudanças no texto original.
Após a aprovação em dois turnos da reforma tributária no Senado, no início de novembro, Haddad deu nota “7,5 com louvor” para o texto final da proposta, mas ressaltou que a “espinha dorsal” da PEC está mantida.
A espinha dorsal da reforma tributária sobre o consumo é a simplificação dos impostos, por meio da substituição dos impostos federais, estaduais e municipais em dois IVAs (Impostos sobre Valores Agregados): a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), de âmbito federal, e o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), estadual e municipal.
O cálculo feito pela equipe da Fazenda considerou o chamado “gap do IVA”, ou seja, da lacuna perdida em arrecadação, e consequentemente quanto do total se poderá arrecadar com os impostos, considera a diferença entre as receitas teóricas esperadas e o montante que deve ser efetivamente arrecadado.
Na projeção, são consideradas as exceções à alíquota padrão dos impostos, ou seja, os setores e produtos que terão alíquotas menores ou regimes diferenciados – o que é chamado de “policy gap“-, assim como a evasão tributária do futuro sistema (o “compliance gap“).
Considerando a sonegação e o número de exceções à alíquota padrão (cobrada de todos setores da economia), mais significativa é a lacuna perdida de impostos, o que diminui a capacidade de arrecadação do imposto sobre valor agregado.
Na teoria, um IVA eficiente em sua totalidade não teria exceções e evasão tributária. Com isso, a capacidade de arrecadação teórica seria igual ao montante de recursos que ingressa nos cofres públicos, como na Nova Zelândia, por exemplo, onde a alíquota de IVA é de 15%.
Governo e Congresso estimam teto de 12,5% do PIB para a carga tributária
Aqui no Brasil, a alíquota do IVA era inicialmente estimada em 25%, mas, diante de todas as exceções, estima-se que a alíquota pode ficar em 27,5%, uma das mais altas do mundo.
Mas Bernard Appy já disse que é preciso ver como vai ficar o desenho final do texto, depois da tramitação no Congresso.
Governo e Congresso já informaram que pretendem manter a atual carga tributária cobrada sobre o consumo brasileiro, com um teto de 12,5% do Produto Interno Bruto (um dos maiores valores do mundo), o que continuará penalizando a população mais pobre. Para dirimir esses efeitos, a proposta contempla um cashback do imposto pago.
Na prática, as exceções beneficiam alguns setores e acabam penalizando outros, como reclamou o setor industrial neste mês. No fim das contas, quem acaba pagando são os consumidores.
Apesar disso, a maioria dos setores considera a reforma tributária, cuja discussão perdura há pelo menos 40 anos, como sendo “bastante positiva”.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias e do G1