Artigo de Deborah Magagna e André Campedelli *
A discussão sobre a proposta do novo arcabouço fiscal tomou conta de todo o noticiário econômico nos últimos dias. A boa aceitação de parte do mercado parece ter sido substituída por críticas em relação às metas que devem ser atingidas, chamadas de irreais por alguns analistas econômicos liberais. As críticas à esquerda também passaram a se avolumar mais, principalmente em relação às incertezas sobre o nível de investimento e ao baixo volume que poderá ser gasto a partir desta nova regra. Porém, esquecemos de coisas importantes nessa semana, é preciso melhorar consideravelmente a economia brasileira, e ações precisam ser tomadas para isso.
Alguns dados sobre o governo Lula já foram apresentados, e mostram o enorme caminho a ser perseguido e a herança maldita deixada pelo governo BolsoGuedes. O desemprego vem aumentando com o término do contrato das vagas temporárias e temos uma tendência de alta para os próximos meses. Além disso, temos uma renda que continua baixa e crescendo pouco, mesmo com o aumento do salário mínimo no começo deste ano.
A qualidade do mercado de trabalho vem se deteriorando desde a implementação da reforma trabalhista, com os trabalhadores tendo menor sucesso em suas negociações salariais, tendo sua renda média reduzida, com maior subocupação em horas trabalhadas e menor nível de emprego, além, é claro, de cada vez mais empregos de menor qualidade sendo formados. Estamos cada vez mais levando pessoas com alta formação educacional para trabalhar em empregos informais, como em aplicativos de automóveis, e que a sua formação nada contribuiu para a realização de tal tarefa.
Outro dado importante foi revelado, o da indústria, setor mais sensível do PIB brasileiro nos últimos anos. A economia nacional vem passando por um verdadeiro processo de desindustrialização, e cada vez mais temos uma indústria menos dinâmica e com elevados problemas. Os primeiros dados deste ano são desanimadores, com queda em setores de alta empregabilidade e que fazem parte de toda uma cadeia produtiva, como é o caso da indústria automobilística. As pessoas estão sem renda e sem condições de financiamento para comprar carros, e um setor tão sensível da economia brasileira vem passando por graves problemas no momento.
Esses são dois setores que têm problemas gritantes neste momento, e até agora pouco temos para resolver essa questão. E a resolução para isso passa por uma política monetária menos restritiva e uma política fiscal que atue no investimento estatal como acelerador econômico neste primeiro momento. E nada disso deve mudar neste curto prazo. A política monetária está atrelada a chantagens que buscam uma política fiscal bastante restritiva, e a política fiscal parece ter cedido às pressões de Campos Neto, com um arcabouço tímido e com pouco espaço para o gasto público em investimento.
Entretanto, temos sim boas notícias neste começo de ano, a inflação. Com uma pressão menor dos alimentos e a possibilidade de uma nova política de precificação da Petrobras, é possível termos um IPCA mais controlado neste ano, o que faz com que a justificativa oficial do Banco Central para manter a taxa de juros em nível tão elevado seja uma falácia. O controle inflacionário é o único que está tranquilo neste momento, e mesmo assim, a política monetária não muda e nem deve mudar nos próximos meses, mesmo tendo sido atendidas todas as vontades do presidente do Banco Central.
Temos aqui uma situação em que é preciso destravar a economia brasileira, e as condições estão dadas para tal. É preciso uma política monetária com juros mais reduzidos e uma política fiscal mais arrojada, com gastos públicos e investimentos mais relevantes para acelerar o motor da economia. Mas até agora nada disso mudou. Precisamos pressionar as mudanças dessas políticas, pois senão, nada vai adiantar uma “economia saudável”, com finanças controladas e uma taxa de juros elevada para evitar a inflação. Então temos que lembrar que, além dos números das planilhas, existe um país real que precisa mudar, e rápido.
*Deborah Magagna é economista do ICL, graduada pela PUC-SP, com pós-graduação em Finanças Avançadas pelo INSPER. Especialista em investimentos e mercados de capitais
*André Campedelli é economista do ICL e professor de Economia. Doutorando pela Unicamp, mestre e graduado em Ciências Econômicas pela PUC-SP, com trabalhos focados em conjuntura macroeconômica brasileira