Em decisão unânime, Copom mantém a taxa Selic em 10,50% ao ano

Comunicado cita "ambiente externo adverso, em função da incerteza elevada e persistente sobre a flexibilização da política monetária nos Estados Unidos" e cita cenário de inflação no Brasil.
19 de junho de 2024

Em linha com o esperado pelo mercado financeiro, o Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central anunciou, no início da noite desta quarta-feira (19), a manutenção da taxa básica de juros (Selic) em 10,50% ao ano. A decisão foi unânime, o que, de certo modo, aplaca o temor do mercado financeiro acerca de uma possível frouxidão na política monetária quando o presidente do BC, Roberto Campos Neto, sair de cena.

Assim, o colegiado interrompe o ciclo de cortes da taxa, iniciado em agosto do ano passado, quando a Selic estava em 13,75% ao ano.

Muito mais do que a decisão, já esperada pelo mercado, a expectativa dos agentes era sobre os votos dos membros do colegiado, em especial o de Gabriel Galípolo, diretor de Política Monetária do BC indicado pelo governo Lula e cotado para assumir a presidência da autoridade monetária no lugar de Campos Neto, cujo mandato termina em 31 de dezembro deste ano.

Na última reunião, houve uma cisão nos votos dos membros do colegiado. De um lado, os cinco indicados pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) – incluindo Campos Neto -, votaram por um corte menor da taxa básica de juros (0,25 ponto percentual), que acabou vencendo. De outro, os quatro indicados por Lula, que queriam um corte de 0,50 p.p., mas por uma questão técnica, como foi mostrado na ata da reunião.

No comunicado divulgado com a decisão de hoje, o colegiado cita que “o ambiente externo mantém-se adverso, em função da incerteza elevada e persistente sobre a flexibilização da política monetária nos Estados Unidos e quanto à velocidade com que se observará a queda da inflação de forma sustentada em diversos países”.

Também cita as pressões inflacionárias no mercado doméstico e traça dois possíveis cenários, que justificariam uma política monetária mais contracionista, já que a decisão de agora se reflete lá na frente: “Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma maior persistência das pressões inflacionárias globais; e (ii) uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada em função de um hiato do produto mais apertado”.

Decisão do Copom sai em meio a críticas do presidente Lula a Campos Neto

Em entrevista à Rádio CBN ontem (18), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, fez críticas contundentes e corretas a Campos Neto, que tem adotado um comportamento mais político nos últimos meses ao participar de jantares e eventos com empresariado e uma ala do bolsonarismo. Esse tipo de comportamento não é o esperado de um chefe de autoridade monetária.

Na entrevista, Lula disse que o presidente do BC tem “lado político” e “trabalha para prejudicar o país”.

“Nós só temos uma coisa desajustada no Brasil nesse instante, é o comportamento do Banco Central, essa é uma coisa desajustada. Um presidente do BC que não demonstra nenhuma capacidade de autonomia, que tem lado político e que, na minha opinião, trabalha muito mais para prejudicar o país do que ajudar, porque não tem explicação a taxa de juros do jeito que está”, afirmou o presidente.

Com o Copom votando unanimemente pela decisão anunciada hoje, fica provado ao mercado que os indicados pelo governo Lula não têm viés político, mas técnico. Portanto, não haveria mais razões, ao menos nesse aspecto, para pressões sem sentido.

Agora, resta saber como a decisão vai se refletir nos próximos dias na Bolsa e no dólar, que caminham bastante instáveis nos últimos dias sob a justificativa das incertezas no ambiente interno.

Veja abaixo o comunicado do Copom:

“O ambiente externo mantém-se adverso, em função da incerteza elevada e persistente sobre a flexibilização da política monetária nos Estados Unidos e quanto à velocidade com que se observará a queda da inflação de forma sustentada em diversos países. Os bancos centrais das principais economias permanecem determinados em promover a convergência das taxas de inflação para suas metas em um ambiente marcado por pressões nos mercados de trabalho. O Comitê avalia que o cenário segue exigindo cautela por parte de países emergentes.

Em relação ao cenário doméstico, o conjunto dos indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho segue apresentando dinamismo maior do que o esperado. A inflação cheia ao consumidor tem apresentado trajetória de desinflação, enquanto medidas de inflação subjacente se situaram acima da meta para a inflação nas divulgações mais recentes.

As expectativas de inflação para 2024 e 2025 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 4,0% e 3,8%, respectivamente.

As projeções de inflação do Copom em seu cenário de referência* situam-se em 4,0% em 2024 e 3,4% em 2025. As projeções para a inflação de preços administrados são de 4,4% em 2024 e 4,0% em 2025. Em cenário alternativo, no qual a taxa Selic é mantida constante ao longo do horizonte relevante, as projeções de inflação situam-se em 4,0% para 2024 e 3,1% para 2025.

O Comitê ressalta que, em seus cenários para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma maior persistência das pressões inflacionárias globais; e (ii) uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada em função de um hiato do produto mais apertado. Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada; e (ii) os impactos do aperto monetário sincronizado sobre a desinflação global se mostrarem mais fortes do que o esperado.  O Comitê avalia que as conjunturas doméstica e internacional seguem mais incertas, exigindo maior cautela na condução da política monetária.

O Comitê monitora com atenção como os desenvolvimentos recentes da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros. O Comitê reafirma que uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida contribui para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária.

Considerando a evolução do processo de desinflação, os cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu manter a taxa básica de juros em 10,50% a.a. e entende que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui o ano de 2025. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.

A conjuntura atual, caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento, ampliação da desancoragem das expectativas de inflação e um cenário global desafiador, demanda serenidade e moderação na condução da política monetária.

O Comitê, unanimemente, optou por interromper o ciclo de queda de juros, destacando que o cenário global incerto e o cenário doméstico marcado por resiliência na atividade, elevação das projeções de inflação e expectativas desancoradas demandam maior cautela. Ressalta, ademais, que a política monetária deve se manter contracionista por tempo suficiente em patamar que consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas. O Comitê se manterá vigilante e relembra, como usual, que eventuais ajustes futuros na taxa de juros serão ditados pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta.

Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Roberto de Oliveira Campos Neto (presidente), Ailton de Aquino Santos, Carolina de Assis Barros, Diogo Abry Guillen, Gabriel Muricca Galípolo, Otávio Ribeiro Damaso, Paulo Picchetti, Renato Dias de Brito Gomes e Rodrigo Alves Teixeira.

* No cenário de referência, a trajetória para a taxa de juros é extraída da pesquisa Focus e a taxa de câmbio parte de R$5,30/US$, evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC). O preço do petróleo segue aproximadamente a curva futura pelos próximos seis meses e passa a aumentar 2% ao ano posteriormente. Além disso, adota-se a hipótese de bandeira tarifária “verde” em dezembro de 2024 e de 2025. O valor para o câmbio foi obtido pelo procedimento, que passou a ser adotado na 258ª reunião, de arredondar a cotação média da taxa de câmbio observada nos dez dias úteis encerrados no último dia da semana anterior à da reunião do Copom”.

 

Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias
 

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