O Brasil tem registrado o maior patamar de dívidas com cartão de crédito em oito anos, refletindo a dificuldade da população em se manter adimplente em um cenário de inflação elevada, renda comprimida, busca por emprego e até falta de dinheiro para comprar a cesta básica. Segundo levantamento recente da CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo), o nível de endividamento com cartão de crédito bateu recorde em agosto, atingindo 79% dos lares do país – o maior patamar desde o início da pesquisa, em 2010. Dados do Serasa mostram que o Brasil chegou a 66,8 milhões de nomes negativados em junho.
O chamado “rotativo“, acionado quando o consumidor não paga a fatura completa do cartão de crédito até o vencimento, registrou R$ 159,3 bilhões em novos empréstimos nos seis primeiros meses do ano. De acordo com o Banco Central, esse é o maior nível para o período desde 2014 -quando foram concedidos R$ 174,7 bilhões (na série atualizada pela inflação).
Tanto o BC quanto especialistas em finanças recomendam que o cartão de crédito rotativo seja usado apenas emergencialmente e por períodos muito curtos. Com taxas de juros elevadas, essa é a linha de crédito mais cara do mercado.
Em junho, os juros do rotativo atingiram 370,4% ao ano. No acumulado em 12 meses, o aumento da taxa média foi de 41,3 pontos percentuais -bem acima da escalada da taxa básica (Selic), que saiu da mínima histórica de 2% em 2021 até o atual patamar de 13,75% ao ano
Nem o aumento dos juros tem freado novos empréstimos nessa modalidade, diferentemente de outros períodos.
Ao menos agora a população não fica indefinidamente no rotativo. Desde abril de 2017, os bancos são obrigados a transferir após um mês a dívida do rotativo para uma linha de crédito parcelado, que tem taxas mais baixas.
Especialistas destacam que a mudança da norma atenuou o efeito “bola de neve”, mas que ninguém deve ter como objetivo buscar o crédito parcelado porque os juros – embora mais baixos que o do rotativo – também são altos. Em junho, a taxa média total nessa modalidade ficou em 173,2% ao ano.
O BC alertou na ata da última reunião do Comef (Comitê de Estabilidade Financeira), divulgada na quinta-feira (8), que o crescimento do crédito em modalidades com maiores riscos indica uma tendência de aumento da inadimplência, ainda que dentro de padrões históricos.
“No caso das famílias, o aumento de ativos problemáticos tem superado o crescimento da carteira de crédito. Essa tendência deverá permanecer com o crescimento do crédito em modalidades mais arriscadas”, escreveu a autoridade monetária em nota.
Uma das maiores dívidas do brasileiro é com cartão de crédito. Ciro e Lula são os únicos candidatos que fazem menção direta ao endividamento das famílias nos programas de governo
Segundo dados da Serasa eCred, uma das maiores dívidas do brasileiro é com cartão de crédito. A maior parcela de endividados é composta por jovens de 25 a 35 anos, com renda de um a dois salários-mínimos, e gasto médio de R$ 3.000.
Quem quer que seja declarado vencedor das eleições de 2022 vai assumir a Presidência com o desafio de melhorar esses indicadores.
Em geral, os candidatos se comprometem com propostas para enfrentar o desemprego e a perda de renda, o que de certa forma tangencia os temas. No entanto, dos quatro melhores colocados nas pesquisas – que juntos representam cerca de 90% das intenções de voto – apenas Ciro Gomes (PDT) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fazem menção direta ao endividamento das famílias nos programas de governo protocolados no TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Ciro Gomes (PDT), que está em terceiro lugar nas pesquisas de intenção de voto, mantém em seu programa uma proposta apresentada na campanha de 2018 de limpar o nome dos brasileiros do SPC/Serasa, com taxas de juros menores e prazos mais longos de pagamento. O candidato do PDT trouxe o “SPCiro” novamente para a corrida eleitoral deste ano, que consiste num refinanciamento governamental dos débitos com taxas de juros menores e prazos mais longos de pagamento.
A campanha do ex-presidente Lula, por sua vez, tem propostas para renegociar as dívidas de famílias e empresas. O plano de governo protocolado no TSE diz que a ideia é fazer isso por meio dos bancos públicos e de incentivos para que as instituições privadas ofereçam condições adequadas aos devedores. A proposta envolve duas frentes de atuação: uma para as dívidas bancárias e outra para as dívidas não-bancárias, que incluem redes de varejo, serviços de água, luz, gás e telefone.
No caso das dívidas bancárias, o objetivo é incentivar as instituições a reconsiderar descontos, prazos e custos para o pagamento em modalidades como cartão de crédito, cheque especial e empréstimos. Isso seria feito por meio da disponibilização de uma parte dos depósitos compulsórios que os bancos fazem junto ao Banco Central.
Para enfrentar as dívidas não-bancárias, Lula anunciou o programa “Desenrola, Brasil”, cuja proposta é criar condições para que consumidores com dívidas em atraso e já incluídos em cadastros negativos possam renegociar seus débitos e limpar o nome.
O presidente Jair Bolsonaro (PL) não apresentou oficialmente um plano para enfrentar a inadimplência ou as dívidas dos lares. De acordo com um integrante da campanha, o candidato à reeleição não propõe um perdão, desconto ou refinanciamento de débitos contraídos.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias