Governo entrega projeto do novo arcabouço fiscal para o Congresso com mudanças para arrecadações extraordinárias e gastos

Além do piso da enfermagem e do Fundeb, também ficarão fora do limite de crescimento de gastos os acordos de precatórios, relativos às eleições, recursos do Fundo Amazônia, instituições federais de ensino, entre outras
19 de abril de 2023

O novo arcabouço fiscal, que substituirá o teto de gastos, foi entregue ontem à noite (18) ao Congresso Nacional. A entrega ocorreu em evento fechado no Palácio do Planalto, com participação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, do vice-presidente do Senado, Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), e do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). A proposta entregue traz novidades, como arrecadações extraordinárias e gastos que ficarão fora da regra fiscal.

A previsão é de que a votação da proposta do novo arcabouço fiscal ocorra até o dia 10 de maio na Câmara. Sem a aprovação da nova regra, políticas públicas podem ficar comprometidas.

Desde o anúncio feito pela equipe econômica até a entrega do projeto, a principal mudança diz respeito às arrecadações extraordinárias, que não serão consideradas para o cálculo do limite de crescimento real (acima da inflação) dos gastos, estabelecido em 70% das receitas, e limitado a um intervalo entre 0,6% e 2,5% acima da inflação. 

Desse modo, a equipe econômica quer evitar que receitas atípicas corram o risco de se tornarem gastos permanentes. As receitas excluídas do cálculo são aquelas vindas de privatizações, concessões, permissões, royalties (exploração de recursos naturais) e dividendos das estatais.

Além disso, outra mudança importante incluída na proposta encaminhada ao Congresso refere-se aos tipos de gastos que podem ficar de fora da nova regra fiscal. Inicialmente, o governo tinha anunciado a intenção de excluir do arcabouço apenas o piso da enfermagem e o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica).

Agora, também ficarão fora do limite de crescimento de gastos os acordos de precatórios (dívidas com sentença definitiva da Justiça) a serem pagos com desconto, os gastos relativos às eleições e os aumentos de capital da União a empresas estatais não financeiras e não dependentes do Tesouro Nacional.

A regra atual do teto de gastos (limita o aumento de gastos à inflação do período anterior) prevê a exclusão das estatais não dependentes do Tesouro e dos gastos eleitorais dos limites de despesas e dos gastos da Justiça Eleitoral. O projeto de lei complementar, no entanto, manterá dentro da regra fiscal os aportes a bancos oficiais.

A mudança tem o objetivo de reduzir o espaço para megacapitalizações em bancos públicos, como foi feito entre 2009 e 2015 com o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

Novo arcabouço fiscal também traz como exceção aumento de gastos para combate às mudanças climáticas e desastres ambientais

Gastos com projetos socioambientais ou relativos às mudanças climáticas custeados com recursos de doações, bem como despesas com projetos custeados com recursos decorrentes de acordos judiciais ou extrajudiciais firmados em função de desastres ambientais também ficarão fora do marco fiscal. Essa mudança vai permitir que o Fundo Amazônia fique fora do novo arcabouço.

Ademais, despesas das instituições federais de ensino custeadas com receitas próprias, de doações ou de convênios também ficarão fora da norma. Na verdade, os gastos ambientais e de doações a universidades federais já estavam fora do teto de gastos desde a Emenda Constitucional da Transição.

Como já era previsto, em relação aos investimentos (obras públicas e compra de equipamentos), o governo incluiu uma trava. De 2025 a 2028, caso o governo economize mais que a banda superior da meta de superávit primário estabelecida pelo arcabouço, até R$ 25 bilhões poderão ser remanejados a investimentos. A proposta original apresentada no fim de março previa que toda a sobra poderia ser destinada a investimentos.

A mudança tem como objetivo, segundo o Ministério da Fazenda, acelerar a redução da dívida pública em momentos de elevado crescimento da economia. Esse valor de R$ 25 bilhões será corrigido ano a ano pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). O piso de R$ 75 bilhões para investimentos, também corrigido anualmente pelo IPCA, está mantido.

Agora, o governo espera que a votação do projeto seja acelerada. Durante a entrega do projeto, o presidente da Câmara dos Deputados disse que a votação da proposta deve ser realizada até o dia 10 de maio.  “Se nós pudermos cumprir o prazo de até o 10 de maio na Câmara, acho que atende bem, dá um debate tranquilo em um tema que você passaria quase 15 dias discutindo amplamente”, afirmou em declaração a jornalistas. “Nossa confiança é plena que teremos um bom resultado, uma boa lei”, projetou, sobre expectativa de aprovação do texto.

O relator da matéria será anunciado por Lira nesta quarta-feira (19). O presidente da Câmara pediu empenho dos líderes para que o projeto possa tramitar rapidamente na Casa. Ele assegurou que haverá transparência nos debates.

Proposta do governo faz mudança na correção do crescimento de despesas

Outra mudança incluída na proposta refere-se ao período do índice de inflação que corrigirá o crescimento das despesas. Foi mantido o sistema vigente no atual teto de gastos, que considera o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) apurado de janeiro a junho e uma estimativa de julho a dezembro. Isso dará ao governo atual uma pequena vantagem em 2024, caso o IPCA caia até meados de 2023 e volte a subir antes do fim do ano.

Por outro lado, em relação ao crescimento das receitas, o novo arcabouço considerará a inflação entre julho de dois anos antes e junho do ano anterior. Essa é a mesma regra que vigorou até 2021 no teto de gastos, que limitava o crescimento do gasto federal à inflação. O intervalo foi alterado com a Emenda Constitucional dos Precatórios.

O novo arcabouço fiscal limitará o crescimento real (acima da inflação) das despesas a 70% do crescimento real das receitas líquidas (descontadas as transferências para estados e municípios) no acumulado em 12 meses.

Outra mudança diz respeito à inclusão dos parâmetros da nova regra fiscal em projeto de lei complementar, que necessita de aprovação por maioria absoluta no Congresso. Originalmente, a proposta era enviar as novas regras por projeto de lei complementar e os parâmetros por projeto de lei ordinária, que requer maioria simples no Congresso (metade mais um dos parlamentares presentes).

Para os próximos quatro anos, no entanto, os parâmetros também serão enviados por meio de projeto de lei complementar. A equipe econômica deu a possibilidade de que o próximo governo estabeleça os parâmetros por projeto de lei simples. Segundo o Ministério da Fazenda, a mudança teve como objetivo demonstrar maior rigor com o cumprimento do novo arcabouço e dificultar mudanças pelo Congresso.

Com o novo arcabouço, os relatórios serão feitos três vezes por ano: em março, junho e setembro. Caso os documentos identifiquem que as metas fiscais não serão cumpridas, cada Poder da União (Executivo, Legislativo, Judiciário), além do Ministério Público da União e da Defensoria Pública da União, não sofrem punições nem precisam bloquear gastos. Apenas não poderão ampliar os gastos em termos nominais. Assim como no sistema atual, haverá limites anuais de gastos para cada Poder.

Por fim, o novo arcabouço muda a Lei de Responsabilidade Fiscal e retira punições em caso de descumprimento de metas fiscais, como impeachment. No entanto, estabelece a obrigatoriedade de o presidente da República justificar-se ao Congresso Nacional e apontar medidas para reequilibrar as contas públicas.

“[Em caso de descumprimento das metas fiscais], o presidente encaminhará mensagem ao Congresso Nacional, até 31 de maio do exercício seguinte, com as razões do descumprimento e as medidas de correção”, destaca o projeto.

Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias e da Agência Brasil 

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