A nova regulamentação para o controle de origem, compra, venda e transporte de ouro de garimpo no Brasil entra na fase final de elaboração na Casa Civil. A MP (Medida Provisória) sobre o tema foi discutida e revista por diferentes ministérios envolvidos na discussão. Desde a crise humanitária dos Yanomamis, a constituição de uma nova lei para o garimpo foi apontada como prioridade pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O ponto de partida de discussão da medida provisória foi o PL (projeto de lei) 2159/2022, de autoria da ex-deputada Joênia Wapichana (Rede-RR), com apoio de outros parlamentares, como Vivi Reis (PSOL/PA).
O texto da medida provisória, agora na Casa Civil, segundo a reportagem publicada na Folha de S Paulo, estabelece uma série de novas exigências nas transações do ouro de garimpo e abre caminho para se estabelecer a rastreabilidade, antigo pleito de quem combate o garimpo ilegal. A MP também deixa claro que o vendedor do ouro é responsável cível e criminalmente pelas informações prestadas sobre o metal durante a venda e transporte.
A rastreabilidade é defendida por ONGs, como o Instituto Escolhas, o Instituto Ethos e o Isa (Instituto Socioambiental), bem como pelo Ibram (Instituto Brasileiro de Mineração), que representa grandes grupos do setor, como Vale, Alcoa e Anglo American.
Segundo o Instituto Escolhas, 54% do ouro de garimpo comercializado no Brasil tem origem suspeita
De acordo com o Instituto Escolhas, a expectativa é de que a minuta seja encaminhada ao presidente Lula, para que possa dar aval para que ela siga o mais rapidamente possível para o Congresso. A entidade que produziu uma série de estudos na tentativa de alterar a lei no setor, afirma que 54% do ouro comercializado no Brasil tem origem suspeita
Segundo a reportagem publicada na Folha de S Paulo, a MP revoga um dos itens mais controversos da atual regulamentação, a presunção da boa-fé na primeira venda do metal. A norma, segundo especialistas envolvidos no combate ao garimpo ilegal, como a PF (Polícia Federal) e o BC (Banco Central), é uma das principais brechas para ‘esquentar’ ouro retirado de terra indígena e área ambiental.
A boa-fé faz parte de um bloco de normas previstas dos artigos 37 a 42 na Lei nº 12.844, de 2013. Os dispositivos foram inseridos pelo deputado Odair Cunha (PT-MG) durante a tramitação de uma MP sobre seguro agrícola, e o texto, sancionado por Dilma Rousseff. A nova lei em elaboração revoga todos esses artigos.
“Na prática, o Brasil funciona como uma imensa lavanderia brilhante desse ouro que é extraído ilegalmente de terras indígenas e unidades de conservação. Está aí o exemplo de Roraima, porque se você tem mais de 20 mil garimpeiros dentro daquela terra, é um verdadeiro exército. Como é que as autoridades não têm um único registro de venda de ouro oriundo daquele estado? Isso significa que esse ouro está sendo escoado para outros lugares, para outros estados, inclusive para o estado de São Paulo, em função de uma situação que a gente tem hoje no Brasil que é o sistema perfeito de impunidade que se montou na legislação brasileira, o qual alimenta e retroalimenta essa máquina de destruição que é o garimpo na Amazônia”, apontou Sérgio Leitão, do Instituto Escolhas, durante entrevista para o ICL Notícias.
Estão em análise hoje duas ADIs (ações diretas de inconstitucionalidade) que questionam a presunção da boa-fé no STF (Supremo Tribunal Federal). A perspectiva é que a MP pode trazer sustentação regulatória para a revogação das normas atuais caso a corte decida pela inconstitucionalidade.
MP ainda prevê exigência de nota fiscal
A proposta do governo também torna obrigatória a emissão da nota fiscal eletrônica. Desde 2001, uma norma interna da Receita Federal mantém o uso da nota de papel na atividade, apesar de o fisco já exigir o documento digitalizado na maioria dos setores.
Outro ponto importante do texto, considerado vital para o combate ao ouro ilegal, é a criação da guia de transporte e custódia do minério. Esse novo documento deverá ser expedido eletronicamente.
A proposta estabelece ainda uma série de responsabilidades para as instituições autorizadas pelo Banco Central a fazer a primeira aquisição do outro, as DTVMs (Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários) que ficam obrigadas a manter estruturas de gerenciamento de riscos para identificar, mensurar, avaliar, monitorar, reportar, controlar a aquisição de ouro, para que fique clara a origem lícita do metal que estão comercializando.
Também as DTVMs passam a ser responsáveis pelo registro de uma série de informações na ANM (Agência Nacional de Mineração), como o posto de atendimento, a agência ou o estabelecimento responsável pela compra, o número da PLG (Permissão de Lavra Garimpeira) de origem, bem como a quantidade adquirida. A transação financeira precisa passar por uma conta bancária.
O dono de DTVM e seus familiares até segundo grau ficam proibidos de serem também dono de lavra garimpeira, e vice-versa. A participação cruzada é apontada como uma alternativa para atuação de grupos criminosos na atividade. Só as DTVMs poderão fazer a primeira venda. Cooperativas de garimpo ficam impedidos de realizar a primeira venda.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias