O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse ontem (5) que o arcabouço fiscal, anunciado na semana passada, vai evitar descontrole da dívida pública, mas não garante a queda da taxa de juros (Selic), durante evento promovido pelo banco Bradesco BBI, em São Paulo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e seus aliados têm sido fortes críticos à atual taxa de juros estabelecida pelo Banco Central, afirmando que a retomada do crescimento econômico brasileiro e só favorece o mercado financeiro e rentistas.
Como palestrante no evento, Campos Neto afirmou que “não existe relação mecânica entre o fiscal e a taxa de juros na forma como é colocada. O importante para a gente é atuar dentro do sistema de metas. Nós temos uma meta de inflação e olhamos as expectativas. O mais importante é como as medidas que estão sendo anunciadas afetam o canal das expectativas”, disse.
“É importante reconhecer o grande esforço que o ministro [Fernando] Haddad e o governo têm feito. O que foi anunciado até agora elimina o risco de cauda, para aqueles que achavam que a dívida poderia ter uma trajetória mais explosiva”, afirmou.
Ele também fez uma avaliação “superpositiva” dos novos mecanismos que devem substituir o teto de gastos (regra fiscal que limita o aumento de gastos do governo à inflação do período anterior) e afirmou reconhecer o “esforço” da equipe econômica do governo Lula.
O presidente do Banco Central ponderou, no entanto, que ainda é preciso saber se o texto passará por alterações no Congresso Nacional. “Eu acho que tem uma certa ansiedade ainda na parte das receitas, e a gente precisa observar como vai tramitar no Congresso”, acrescentou.
O presidente do Banco Central afirmou também que não vê um cenário de crise de crédito, mas uma desaceleração desse mercado em linha com uma taxa de juros mais alta, como ocorre em outros países neste momento. Disse, ainda, que números recentes mostram uma atividade econômica um pouco melhor do que nos meses anteriores e que o cenário hoje é de desaceleração da economia, mas não uma “desaceleração dramática”.
Presidente do Banco Central rebateu análises que consideraram a ata do Copom mais política do que técnica
O presidente do Banco Central também rebateu afirmações, as quais ele considera equivocadas, como a de que a inflação hoje está relacionada a problemas de oferta e não de demanda, e que as manifestações do Copom (Comitê de Política Monetária) após a decisão mais recente de não mexer nos juros foi política e não técnica.
“A tentativa de politizar um processo que é totalmente técnico é uma coisa que deixa os funcionários da casa e os diretores, de uma forma geral, bem preocupados. Quando a gente escuta comentários de isso é uma decisão política… Não tem nada na decisão que é política. É sempre técnico”, disse presidente do Banco Central, sobre as críticas à ata da última reunião do Copom, que manteve a taxa básica de juros no patamar de 13,75%.
A nova regra fiscal limitará o crescimento da despesa a 70% da variação da receita dos 12 meses anteriores. O novo arcabouço combinará um limite de despesa mais flexível que o teto de gastos com uma meta de resultado primário (resultado das contas públicas sem os juros da dívida pública).
Dentro desse percentual de 70%, haverá um limite superior e um piso, uma banda, para a oscilação da despesa, com desconto do efeito da inflação.
Em momentos de maior crescimento da economia, a despesa não poderá crescer mais de 2,5% ao ano acima da inflação. Em momentos de contração econômica, o gasto não poderá crescer mais que 0,6% ao ano acima da inflação.
Em outro evento, promovido pela Esfera Brasil, Campos Neto disse que a inflação no Brasil, que tem dificultado a queda na taxa básica de juros, tem parte da sua origem em um aumento da demanda por produtos. “A gente tem a linha de serviços voltando, o consumo de serviços voltou para a linha de tendência. Mas o de bens, não. Ele está muito acima da linha de tendência. Você teve um deslocamento da demanda de bens, que foi estrutural”, analisou.
Segundo ele, essas pressões inflacionárias acabam se refletindo em outras áreas, como no mercado de energia. “Se eu tenho um aumento na demanda de bens, que é estrutural, eu também tenho um aumento na demanda de energia, que é estrutural. Porque para o mesmo valor agregado de bens, eu consumo quase cinco vezes mais energia do que de serviços”, disse.
O presidente do Banco Central atribuiu, em parte, esse movimento aos benefícios concedidos para conter os efeitos da pandemia de Covid-19 sobre a economia. “Foi colocado muito dinheiro em circulação através de benefícios monetários e fiscais. Só de fiscais foram R$ 9 trilhões em uma economia de R$ 80 trilhões, mais de 10%”, ressaltou.
Campos Neto defendeu a política monetária, que tem mantido a taxa básica de juros em um patamar elevado para conter a inflação. “A gente tenta suavizar o ciclo. A gente olha para frente. A gente entende que os juros altos causam esses impactos na parte produtiva. A gente tenta suavizar isso, porque o nosso trabalho é fazer isso na forma que cause o mínimo de dano possível à economia”, destacou.
De acordo com ele, apesar das dificuldades causadas na economia no momento, a política monetária evita problemas maiores no futuro. “O custo de combater a inflação é muito alto e é sentido no curto prazo. O custo de não combater é muito mais alto e é muito mais nocivo e mais perene.”
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias e Agência Brasil