Câmara aprova MP do ‘home office’ sem cláusula de negociação coletiva, enquanto Senado confirma aprovação de MP que flexibiliza leis trabalhistas

O texto da MP do home office, além de não incluir a negociação coletiva, propõe que o trabalhador possa sacar o saldo do auxílio-alimentação não utilizado após 60 dias. O benefício não pode ser usado para outro fim que não seja compra de comida
3 de agosto de 2022

A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (3) o texto principal da Medida Provisória (MP) 1.108, que regulamenta o teletrabalho (home office) e altera regras do auxílio-alimentação. O texto, que “caduca” no próximo domingo, ainda precisa passar pelo Senado. Foram 248 votos a favor e 159 contrários. Ainda pode haver alterações com os destaques. Para facilitar a aprovação do relatório, ficou fora do texto a obrigatoriedade da negociação coletiva para definir as regras do home office, mas foi mantida a cláusula sobre contrato individual, como queria o governo. A oposição quer a inserção da negociação coletiva para maior proteção ao trabalhador

O texto aprovado facilita o home office (teletrabalho) de maneira permanente, abrindo a possibilidade de adoção definitiva de um modelo híbrido e também a adoção de um esquema de trabalho por produção — e não apenas por jornada de trabalho. O home office na pandemia foi uma alternativa importante durante o período de isolamento social.

Com a MP, o trabalhador poderá ser contratado seguindo as regras da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), mas sob o regime de produção, inclusive sem controle de ponto, quando estiver no regime de telebrabalho.

A MP considera teletrabalho ou trabalho remoto (o home office) a prestação de serviços fora das dependências do empregador, de maneira preponderante ou não. O texto estabelece ainda que a presença do trabalhador no ambiente de trabalho para tarefas específicas, ainda que de forma habitual, não descaracteriza o trabalho remoto.

O empregado em regime de teletrabalho ou trabalho remoto poderá prestar serviços por jornada (com controle de ponto) ou por produção ou tarefa.

Na hipótese da prestação de serviços em home office por produção ou por tarefa não será cobrado o ponto do trabalhador e nem é necessário estabelecer horários de almoço, por exemplo. O empregado pode escolher seus horários. Ele precisará apresentar, porém, os serviços contratados. Além disso, deve seguir todas as demais regras da CLT.

A oposição vê retrocesso. “A negociação coletiva dá segurança ao trabalhador e ao empresário. Os trabalhadores vão ficar na mão de chefes imediatos, que vão fazer o que quiser”, afirmou Carlos Zarattini (PT-SP). O líder do PSB, Bira do Pindaré (MA), também criticou. “Eles (governo) têm saudade dos primórdios do capitalismo, quando não tinha regra.”

De acordo com o governo, não estão sendo alteradas regras previdenciárias, isto é, a pessoa que adotar o teletrabalho continua com as mesmas normas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) que valem para o trabalho presencial.

O texto estabelece que para atividades em que o controle de jornada não é essencial, o trabalhador terá liberdade para exercer suas tarefas na hora que desejar. Caso a contratação seja por jornada, a MP permite o controle remoto da jornada pelo empregador, viabilizando o pagamento de horas extras caso ultrapassada a jornada regular

Os empregadores deverão conferir prioridade aos empregados com deficiência e aos empregados e empregadas com filhos ou crianças sob guarda judicial até quatro anos de idade na alocação em vagas para atividades que possam ser efetuadas por meio do teletrabalho.

Além do modelo híbrido de trabalho, o funcionário poderá trabalhar em uma localidade diferente de onde foi contratado. Nesse caso, vale a legislação de onde ele celebrou o contrato. Com isso, o trabalhador pode morar em outro estado ou outro país, mas seguindo as regras da CLT.

A MP diz que o tempo de uso de equipamentos tecnológicos e de infraestrutura necessária, e de softwares, de ferramentas digitais ou de aplicações de internet utilizados para o home office fora da jornada de trabalho normal do empregado não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso.

O uso de um celular da empresa, por exemplo, fora do horário de trabalho não pode contar como sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou em acordo ou convenção coletiva de trabalho.

A MP também assegura que não há possibilidade de redução salarial por acordo individual, ou seja, não existe nenhuma diferença em termos de pagamento de salário para quem trabalha de forma presencial ou remota.

Segundo o relator, deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), o relatório foi baseado em uma negociação, primeiro na casa do presidente (da Câmara) Arthur Lira (PP-AL), junto com os líderes, e depois com a oposição.

O ex-sindicalista disse que gostaria de ter incluído a obrigatoriedade da negociação coletiva para definir as regras do home office, mas manteve a cláusula sobre contrato individual – como queria o governo – para facilitar a aprovação do relatório.

As centrais sindicais divulgaram nota defendendo a participação dos sindicatos no tema. O próprio Paulinho disse ser a favor por saber que quem entende melhor de cada uma das categorias são os trabalhadores e o empresários do setor, e a negociação coletiva poderia resolver. Para ele, a lei, daqui um tempo, terá de ser corrigida.

MP do home office  determina que o vale-refeição não pode ser usado para nenhum outro gasto que não seja compra de comida

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Crédito: Agência Brasil / Arquivo

Em relação ao popular vale-refeição, a MP determina que as importâncias pagas pelo empregador “deverão ser utilizadas para o pagamento de refeições em restaurantes e estabelecimentos similares ou para a aquisição de gêneros alimentícios em estabelecimentos comerciais”, e as pessoas jurídicas beneficiárias não poderão exigir deságio ou desconto. Uma alteração proposta pelo relator é dar possibilidade de que o trabalhador saque o saldo não utilizado após 60 dias.

A MP deixa claro que o auxílio-alimentação não pode ser usado para nenhum outro gasto que não seja compra de comida — depois de 60 dias com o recurso parado, porém, o trabalhador poderá sacar o saldo não utilizado e usar para qualquer fim.

A proposta também proíbe que as fornecedoras de tíquetes-alimentação deem descontos para as empresas que contratam o serviço. Por exemplo: antes, uma empresa poderia contratar R$ 50 mil em auxílio-alimentação, mas pagar menos — essa diferença era compensada com cobrança de taxas para os restaurantes e supermercados. Na avaliação do governo, o método fazia com que a alimentação dos trabalhadores ficasse mais cara.

A MP estabelece multa de R$ 5 mil a R$ 50 mil, aplicada em dobro em caso de reincidência ou embaraço à fiscalização. Estão sujeitos ao pagamento os empregadores, as empresas emissoras dos cartões de pagamento do auxílio e os estabelecimentos que comercializam produtos não relacionados à alimentação.

Senado aprova MP que flexibiliza leis trabalhistas em caso de “calamidades públicas”

Ainda na quarta-feira (3), o Senado confirmou a aprovação da Medida Provisória (MP) 1.109,  por 51 a 17 votos, que aprofunda a flexibilização das leis trabalhistas, agora durante a vigência de calamidades públicas. Dessa forma, várias regras poderão ser alteradas “a critério do empregador”, termo repetido várias vezes ao longo da MP, que havia sido aprovada na véspera pela Câmara.

A proposta é vista pela oposição como mais uma iniciativa de precarização das condições de trabalho, sem qualquer contrapartida. “Desumano”, definiu a senadora Zenaide Maia (Pros-RN). Para o líder da Minoria, Jean Paul Prates (PT-RN), a MP 1.109 é um “cheque em branco” para alterar a legislação, e está sendo discutido em pleno período pré-eleitoral. “Essas coisas são objetos de planos de governo. É claramente um projeto que não teve discussão. Não é hora de discutir isso. Não há urgência nenhuma”, acrescentou.

Entre os itens trabalhistas que podem ser alterados em condições declaradas como calamidade, estão o teletrabalho ou home office, antecipação de férias individuais, concessão de férias coletivas, antecipação de feriados, banco de horas e recolhimentos do FGTS. Contratos de trabalho poderão ser suspensos temporariamente, com redução proporcional da jornada e salário. A MP usa regras do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, adotado durante a pandemia.


Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias

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