Em conversa com jornalistas horas após a decisão do Copom (Comitê de Política Monetária) de manter a taxa Selic em 13,75% anual, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, criticou, ontem (22), a definição e, principalmente, o comunicado divulgado pela autoridade monetária, o qual classificou como “muito preocupante”. Foi a quinta manutenção seguida da taxa básica no patamar atual, o mais alto dos seis últimos anos. A próxima reunião do Copom será em 2 e 3 de maio.
Ignorando toda a pressão do governo, de empresários e dos trabalhadores, o tom duro do comunicado do Banco Central frisou a “deterioração adicional” das expectativas de inflação e sinalizou que pode, inclusive, aumentar ainda mais os juros, caso considere necessário. O BC também citou a incerteza sobre a nova regra fiscal e seus impactos sobre as expectativas para a trajetória da dívida pública como fator que pesou em sua decisão.
“Eu considerei o comunicado preocupante, muito preocupante, porque hoje nós divulgamos o relatório bimestral da Lei de Responsabilidade Fiscal mostrando que nossas projeções de janeiro estão se confirmando sobre as contas públicas [com déficit menor]”, disse Haddad. E completou: “O comunicado deixa em aberto. Num momento em que economia está retraindo e que o crédito está com problemas, sobretudo empresas, famílias, o Copom chega a sinalizar até a possibilidade de uma subida da taxa de juros, que já é hoje a mais alta do mundo.”
Ontem, o economista e fundador do ICL (Instituto Conhecimento Liberta), Eduardo Moreira, disse que manter a taxa básica de juros no patamar atual só é bom para o mercado financeiro e não faz sentido pela conjuntura atual no país, de desemprego, perda de renda e queda na demanda por parte dos consumidores.
Haddad salienta que novos aumentos da taxa Selic, conforme indicação do comunicado do BC, podem comprometer resultado fiscal
Segundo Haddad, o tom do comunicado preocupa principalmente por indicar novas possíveis altas. “A depender das futuras decisões, nós podemos, inclusive, comprometer o resultado fiscal, porque daqui a pouco você vai ter problema das empresas para venderem, recolherem impostos. Nossa preocupação é essa”, afirmou o ministro.
A esperança de Haddad é que, a exemplo do que ocorreu na primeira reunião do Copom sob o governo Lula, o comunicado tenha vindo em tom mais duro para, depois, a ata da assembleia vir mais branda, mostrando que o BC reconhece os esforços que vêm sendo feitos pela equipe econômica para tentar reequilibrar as contas.
“Tomara que isso aconteça de novo, esperamos que isso aconteça de novo. Mas nós vamos fazer chegar ao BC a nossa análise do que é mais recomendável para a economia brasileira encontrar o equilíbrio. Equilíbrio de trajetória da dívida, da inflação, das contas públicas, do atendimento às demandas sociais. Esse conjunto de fatores precisa ser considerado, segundo a própria lei que dá autonomia ao Banco Central”, disse o ministro.
Em relação à “deterioração adicional” das expectativas de inflação citada no comunicado do BC, Haddad disse se tratar de um aspecto “conjuntural” e avaliou que o BC deveria considerar os “fundamentos da economia” em sua decisão sobre juros.
“Não há nada de estrutural nessa desancoragem. Se estivesse havendo alguma coisa de estrutural acontecendo, nós tínhamos que ter muito mais cautela. Mas expectativa é uma coisa que se muda de um dia para o outro”, observou o ministro.
Ministro diz que atraso na divulgação do novo arcabouço fiscal não influenciou decisão do BC
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixou para abril, após o retorno de sua viagem à China, a divulgação da nova regra fiscal, que substituirá o teto de gastos (regra de limita o aumento de gastos do governo à inflação do período anterior).
Mas, para Haddad, o adiamento não tem nada a ver com a decisão do BC, pois o prazo legal para o envio da proposta é 31 de agosto, conforme estabelecido pela PEC (Proposta de Emenda à Constituição) da Transição.
“Isso não pode ter feito parte das considerações do Copom nesse momento. Nós estamos com toda a cautela, com todas as consultas recomendadas pelo presidente da República que já foram feitas”, disse.
Ainda sobre a decisão do BC, Haddad disse que o governo teme seus efeitos sobre a atividade econômica. “A economia precisa estar funcionando para as contas se equilibrarem”, ressaltou, enfatizando que, diferentemente do que vem ocorrendo em outros países, por aqui, a inflação já desacelerou.
Haddad ainda comentou que as críticas que o governo vem fazendo à taxa Selic e até mesmo ao presidente da autoridade monetária, Roberto Campos Neto, não estão criando ruídos entre Executivo e Banco Central.
“Não existe ruído quando existe boa fé. Eu estou aqui de boa fé, emitindo uma opinião que eu penso que deva ser considerada pela autoridade monetária […]. Aliás, eu falo em harmonia desde a primeira entrevista que eu dei ainda em dezembro, em harmonizar as políticas monetária e fiscal. E eu vou continuar perseverando com esse objetivo”, frisou.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias e da Folha de S.Paulo