Moeda comum entre Brasil e Argentina não significa o fim do real ou do peso, diz o número 2 da Fazenda

"Não tem nenhum tipo de semelhança com o euro, que é uma moeda única que substituiu as moedas nacionais. Ela [moeda comum entre Argentina e Brasil) é uma moeda para você convencionar as relações comerciais entre os dois países", disse Galípolo em entrevista à Rádio CBN
26 de janeiro de 2023

Há muitas informações distorcidas sendo divulgadas a respeito do projeto de criação de uma moeda comum entre Brasil e Argentina. Segundo o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo, a proposta anunciada pelo ministro Fernando Haddad e seu par argentino Sergio Massa, em encontro no país vizinho esta semana, não é similar ao euro, que substituiu as moedas dos países que formam o bloco europeu. “Não tem nenhum tipo de semelhança com o euro, que é uma moeda única que substituiu as moedas nacionais. Ela [moeda comum entre Argentina e Brasil) é uma moeda para você convencionar as relações comerciais entre os dois países”, disse o número 2 da Fazenda, em entrevista ao Jornal da CBN, da Rádio CBN, ontem de manhã (25).

Em suma, seria uma espécie de moeda virtual, a qual, se for mesmo lançada, não significará o fim do real ou do peso argentino. A nova moeda funcionaria apenas como unidade de conta para o fluxo comercial entre os dois países, o qual é determinado em dólares hoje. Como a Argentina está com escassez da moeda americana, isso faz com que o comércio entre os dois países se torne um problema. Mais importante é que a criação dessa nova moeda permitirá que o Brasil não absorva os riscos da Argentina, e vice-versa.

Conforme explicou Galípolo na entrevista, o país vizinho é um parceiro comercial muito importante para o Brasil, mas o comércio entre os dois países caiu muito nos últimos anos, na casa de bilhões, principalmente ao longo do governo de Jair Bolsonaro (PL). Dessa forma, outros países ganharam espaço no comércio com a Argentina “por apresentarem soluções para as restrições que a Argentina tem hoje de divisas que possam ser aceitas no mercado internacional”.

“O que quero dizer com isso? A baixa conversibilidade do peso apresenta dificuldades e restrições para que a Argentina possa comprar no mercado internacional. A China, por exemplo, costuma dar créditos para a exportação de seus produtos à Argentina, ou seja, [a China] financia os importadores em moeda doméstica chinesa para que se possa pagar compras de produtos da China”, explicou.

O secretário-executivo da Fazenda disse que existe uma linha de swap cambial entre os bancos centrais chinês e argentino para garantir essa oferta de moeda chinesa para as importações argentinas.

Dentro da estrutura da criação da moeda comum, haverá um fundo garantidor de exportação por intermédio de bancos

“O primeiro ponto que foi anunciado pelo ministro Fernando Haddad e pelo ministro Massa é justamente retomar uma linha de financiamento para exportação. Essa linha pode ser feita por qualquer banco, público ou privado. Ele vai lá e paga diretamente o exportador brasileiro. Linhas de financiamento em reais vão financiar a exportação do Brasil exclusivamente para exportação de bens e serviços brasileiros para a Argentina”, disse Galípolo.

A fim de garantir que não haverá calote de um lado e de outro, será colocado um fundo garantidor de exportação. “Caso ele [fundo garantidor] seja acionado, se ela [Argentina] não tiver pesos para pagar os reais necessários, estamos exigindo um colateral, que são garantias reais, mercadorias ou títulos que possam ter conversibilidade em moeda forte ou reais no mercado internacional. Aí, quem fica com o risco de crédito do importador do governo argentino é o próprio governo argentino. O ministro Massa está optando, por exemplo, pelo Banco de La Nación Argentina para empenhar esse papel”, frisou.

O desenho que vem sendo elaborado é o seguinte, conforme explicou o secretário: o banco fica com o risco do fundo garantidor, o fundo garantidor fica com o risco Argentina e a Argentina fica com o risco do importador.

“Qualquer tipo de troca, qualquer tipo de comércio precisa de uma unidade de conta [moeda] e de um meio convencionado entre os países. A intenção é para que a gente possa convencionar isso e fazer com que a política monetária americana, que é a moeda [dólar] usada preferencialmente no comércio internacional, não vá constranger o comércio entre países, criando algum tipo de restrição ao subir a taxa de juros nos EUA”, complementou.

Haddad e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva estiveram em visita à Argentina esta semana e, depois, ao Uruguai, a fim de retomar as relações entre os países e com vistas a voltar a fortalecer o comércio no âmbito do Mercosul. “Temos o desafio de nos reencontrarmos e seguirmos uma trajetória de recuperação do comércio bilateral que já foi muito forte em relação ao tamanho do PIB [Produto Interno Bruto] de Argentina e Brasil. Há 10 anos perdemos quase 40% do comércio bilateral, o que nos impõe desafios, e também compromissos trabalhistas”, explicou o ministro da Economia argentino em entrevista coletiva ao lado de Haddad, transmitida no final da tarde de segunda-feira (23).

Ao comentar política de preços da Petrobras, Galípolo diz que investir em economia verde pode ser a saída

Questionado sobre o reajuste de 7,46% no preço da gasolina esta semana, Galípolo disse que a política de preços dos combustíveis está no radar da equipe econômica. “A política de preços da Petrobras é um problema que tem afligido diversos governos e causado constrangimento para a população. A gente tem uma matriz de transporte excessivamente rodoviária e isso acaba tendo impacto em toda a cadeia produtiva. A nova gestão já vem estudando há bastante tempo formas de tentar amortecer essa oscilação do preço internacional que está sujeito a todo tipo de problemas de conflitos, como aconteceu no começo do ano passado”, disse.

De acordo com Galípolo, o desafio é discutir como o Brasil vai reduzir sua dependência de combustível fóssil e fazer essa substituição migrando para uma economia mais verde. Essa transição, segundo ele, faz com que “gradativamente faça menos sentido utilizar recursos de esforço fiscal para subsidiar um combustível que é poluente, e para que a gente possa, sim, fomentar aquele tipo de matriz energética que gera externalidade positiva para a sociedade como um todo”.

A expectativa agora, segundo ele, é para a posse do senador Jean-Paul Prates como presidente da Petrobras, o que deve acontecer na próxima semana, para que esse assunto seja discutido de modo mais aprofundado. “Já tivemos vários diálogos com ele, que já deixou públicas várias propostas que estudou ao longo do tempo. Mas a Petrobras é uma empresa que tem uma excelente governança, é uma empresa de capital aberto, e acho que essa discussão vai se dar de uma maneira mais ampla envolvendo diversos ministérios e o próprio presidente da República”.

O debate passará pelas seguintes diretrizes, conforme pontuou o secretário-executivo da Fazenda: contemplar no debate as próprias necessidades de governança da Petrobras e, simultaneamente, suavizar para a população os choques das oscilações dos preços do petróleo e da gasolina.

Redação ICL Economia
Com informações da Rádio CBN

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