Apreensivos com o avanço de um projeto de lei na Câmara dos Deputados, que prevê a limitação de taxas cobradas no rotativo do cartão de crédito, o setor bancário brasileiro iniciou uma negociação com o Ministério da Fazenda e com o Banco Central para acelerar o acordo sobre os juros dessa modalidade. O rotativo tem sido uma preocupação da equipe econômica do governo Lula desde o início do mandato.
A proposta que tramita na Câmara deixa as instituições financeiras com receio de que a solução venha do Congresso e, por isso, preferem a negociação direta com a equipe econômica.
A taxa de juros no rotativo dos cartões está atualmente em 437% ao ano e é a mais alta praticada no mercado, e responsável por grande parte do endividamento das famílias brasileiras. Atualmente, a inadimplência do crédito atinge cerca de 50% das operações, um índice sem precedentes em outros países.
Hoje, os usuários do cartão entram automaticamente no rotativo quando não conseguem pagar a totalidade da fatura ou quitam apenas uma parte do vencimento do cartão de crédito naquele mês, situação que acaba virando uma bola de neve para a maioria.
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, sugeriu há alguns dias o fim das compras parceladas sem juros no cartão, as quais, na avaliação dele, são as responsáveis pelos juros exorbitantes do rotativo.
No entanto, a medida foi duramente criticada por analistas, inclusive pelos economistas do ICL (Instituto Conhecimento Liberta), para os quais a proposta de acabar com o parcelamento das compras no cartão coloca em risco a recuperação do varejo e a retomada econômica. Embora a suposta intenção da autoridade monetária seja reduzir a inadimplência e combater as altas taxas de juros no crédito rotativo do cartão de crédito, essa medida pode ter consequências adversas para os consumidores e comerciantes, impactando negativamente a economia e a inclusão financeira.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já se mostrou contrário à alteração das regras do parcelamento sem juros. Na opinião do ministro, isso também pode prejudicar lojistas e consumidores.
“Nós herdamos uma taxa de juros absurda do rotativo e vamos ter que equacionar, mas [a solução] não passa por prejudicar o consumidor que está pagando as contas em dia”, criticou Haddad.
Ainda segundo Haddad, os bancos precisam apresentar dados que justifiquem a necessidade de restringir o parcelamento, o que ainda não foi feito.
Segundo o ministro, a previsão é que um grupo de trabalho formado por representantes do Ministério da Fazenda, do Banco Central, da Febraban (Federação Brasileira de Bancos), do IDV (Instituto para Desenvolvimento do Varejo), da Câmara dos Deputados e do Senado encontre uma solução em até 90 dias.
PL que quer limitar taxas do rotativo do cartão está tramitando na Câmara desde outubro passado
O projeto de lei (PL 2685/2022) para regular a taxa do rotativo entrou na Câmara em outubro de 2022, sob autoria do líder do União Brasil, Elmar Nascimento (BA). A proposta também trata da renegociação de dívidas para quem ganha até R$ 5 mil. O programa chamado de ReFamília se assemelha ao Desenrola, editado pelo governo federal.
A proposta já passou pela Comissão de Finanças e Tributação e está pronta para ir ao plenário. A relatoria está com o deputado Alencar Santana (PT-SP). De acordo com o texto, caberia ao CVM (Conselho Monetário Nacional), colegiado formado pela Fazenda, Planejamento e Banco Central, estabelecer limites para as taxas de juros do rotativo.
Segundo a proposta, os juros “não poderão ser superiores a limites já estipulados para modalidades de crédito com perfil de risco semelhante, a exemplo do que já ocorre com as taxas cobradas sobre o valor utilizado do cheque especial”.
O CMN já adotou antes medidas para regular o rotativo do cartão. Em 2017, determinou que os clientes só pudessem ficar um mês no rotativo do cartão de crédito. Após esse prazo, deveriam migrar para outras modalidades de crédito, nas quais os juros são menores.
O CMN também já limitou os juros do cheque especial. Em novembro de 2019, determinou que a taxa poderia ser no máximo de 151% ao ano.
De acordo com reportagem de O Globo, fontes do Banco Central e do Ministério da Fazenda disseram que o assunto será resolvido e o acordo sairá “em menos de 90 dias”. Porém, como há muitos segmentos envolvidos, há divisões sobre a melhor solução e isso dificulta um desfecho rápido.
As negociações serão feitas com cautela para que não aconteça com o rotativo o mesmo que houve com o consignado dos aposentados.
Após o Conselho Nacional de Previdência ter reduzido o teto dos juros, vários bancos do país simplesmente cancelaram essas linhas, e o governo foi obrigado a recuar.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias e de O Globo