Estudo da FGV/USP mostra que empresas pagam metade do imposto previsto de tributação sobre o lucro

Benefícios e brechas legais permitem que, na prática, empresas de capital aberto paguem alíquota menor que a média mundial, jogando por terra argumento usado para não haver tributação sobre lucros e dividendos pagos a acionistas. Estudo servirá de base para a reforma do IR.
30 de outubro de 2023

Embora o Brasil tenha altas cargas de tributação sobre o lucro, benefícios e brechas na legislação permitem que as empresas paguem somente a metade desse percentual. Enquanto a lei prevê alíquota de 34% sobre o lucro das grandes empresas de capital aberto, na prática, o efetivamente pago por elas ficam em 18,1%.

É o que mostra estudo elaborado pelo Observatório de Política Fiscal do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas) e pelo Made/USP (Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades da Universidade de São Paulo) com apoio da organização social Samambaia.org, mantenedora da República.org. O estudo foi publicado pela Folha de S.Paulo.

Conforme mostra o estudo, o Brasil possui uma das mais elevadas cargas tributárias corporativas do mundo, mas o efetivamente pago está abaixo da média global, de 23,5%.

O levantamento mostra, portanto, que não encontra respaldo na realidade um dos principais argumentos utilizados por essas empresas para justificar a isenção de Imposto de Renda na distribuição de lucros e dividendos a seus acionistas: a afirmação de que esse benefício seria compensado por um imposto corporativo mais elevado do que em outros países.

O estudo “Alíquotas Efetivas e Incidência do Imposto de Renda Corporativo” aponta que a diferença entre a alíquota prevista em lei e o percentual efetivamente pago é explicada pela existência de benefícios fiscais e práticas de planejamento tributário que reduzem a carga dessas companhias, além da evasão fiscal e de decisões judiciais que afetam o pagamento de tributos.

Os autores destacam também que a diferença entre carga nominal e imposto recolhido cresceu ao longo do período analisado (2012 a 2022) e que essa diferença é maior em alguns setores do que em outros, criando um grupo de empresas mais privilegiadas.

Foram utilizados dados dos balanços das 336 empresas que estiveram registradas na Bolsa de Valores no período de 2012 a 2022, incluindo indústrias, varejistas e companhias do setor de serviços — excluindo apenas instituições financeiras.

Na comparação internacional, a tributação efetiva das empresas analisadas estaria abaixo do verificado nos EUA (21,2%) e nas amostras para Europa (25,7%) e países emergentes (26,4%) do estudo da NYU, que considera a média de 2016 a 2021.

Essa distorção ocorre, segundo os autores, porque, quando a tributação de 34% com isenção de dividendos foi instituída no país, a carga sofrida pelas empresas brasileiras estava próxima da de outros países. Nas últimas décadas, no entanto, houve um movimento de redução de alíquotas em várias economias.

Tributação sobre o lucro: estudo vai servir de base para a discussão da reforma sobre o IR

Um dos objetivos do estudo é servir de referência para as discussões sobre a reforma do Imposto de Renda, que está sendo elaborada pela secretaria extraordinária do Ministério da Fazenda que trata do tema.

A ideia do governo é reduzir a alíquota de 34% dos tributos sobre o lucro corporativo (IRPJ/CSLL) e cobrar o IR na distribuição de lucros e dividendos.

Os autores do trabalho, os economistas Manoel Pires (FGV), Pedro Romero Marques (USP) e José Bergamin (USP), avaliam que seria positiva uma reforma que aproximasse a alíquota nominal da efetiva, permitindo que todas as empresas tenham uma tributação menor, e não somente aquelas beneficiadas pelas distorções do sistema atual.

Eles ainda destacam como necessária a revisão de brechas e benefícios, o que reduziria a complexidade, os custos associados às exceções e a pressão para ampliação de regimes especiais com carga tributária reduzida, como o lucro presumido e o Simples Nacional.

Por fim, defendem o fim da isenção na distribuição de lucros, afirmando que o argumento de que as corporações são sobretaxadas no Brasil, de modo a compensar a inexistência do imposto sobre dividendos, não encontra respaldo nos resultados obtidos.

“Se é verdade que o Brasil consolidou a tributação de lucro e dividendos nas empresas, você deveria esperar uma carga efetiva muito maior em relação aos outros países que separam essa tributação. E a gente encontra exatamente o contrário. Na verdade, a gente não está tributando lucro e dividendos em lugar nenhum”, disse Manoel Pires, coordenador do Observatório de Política Fiscal do FGV Ibre.

Entre os países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), por exemplo, a soma das alíquotas do imposto sobre o lucro das empresas e dos dividendos supera 40%, na média.

Os autores também defendem uma reforma do IR que inclua uma revisão de gastos tributários e outros tipos de benefícios fiscais, mas que observe a capacidade de pagamento das empresas e a necessidade de arrecadação do Estado.

Redação ICL Economia
Com informações da Folha de S.Paulo

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