Após um intenso dia de negociações de lideranças parlamentares ontem (23), a Câmara dos Deputados aprovou, ainda na noite de terça-feira, o texto-base do novo arcabouço fiscal, em uma vitória extremamente importante para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), por 372 votos a favor e 108 contrários. O governo precisava de, no mínimo, 257 votos.
Nesta quarta-feira (24), a Casa deve votar os destaques da matéria (mudanças no texto). Após essa etapa, o texto segue para o Senado. A expectativa é que os destaques sejam rejeitados.
“A demonstração do painel, tanto da urgência quanto do mérito, demonstra que era um texto equilibrado. Tanto que posições mais à direita e à esquerda convergiram em votar determinadas matérias”, disse o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), em relação ao texto do relator, o deputado Claudio Cajado (PP-BA).
O PLP (Projeto de Lei Complementar) 93/23 fixa regras para manter as despesas abaixo das receitas a cada ano e, se houver sobras, usá-las apenas em investimentos, buscando trajetória de sustentabilidade da dívida pública. A política de valorização do salário mínimo e o Bolsa Família ficaram fora das regras a pedido do presidente Lula.
O substitutivo do relator aprovado ontem, aponta que critérios para a variação real (descontada a inflação) da despesa são fixados de forma permanente, sem depender do projeto da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias), como previso no texto original.
Desse modo, a cada ano haverá limites da despesa primária reajustados pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) e, também, por um percentual do quanto cresceu a receita primária descontada a inflação.
Texto do arcabouço fiscal obriga o governo a adotar medidas de contenção de gastos, caso o patamar mínimo da meta de resultado primário não seja atingido
Cajado incluiu também no texto a obrigatoriedade de o governo adotar medidas de contenção de despesas caso não seja atingido o patamar mínimo para a meta de resultado primário a ser fixada pela LDO. Desse modo, a variação real dos limites de despesa primária a partir de 2024 será cumulativa.
Pela regra proposta, o crescimento do limite de gasto do ano seguinte deve equivaler a 70% da variação da receita em 12 meses acumulados até junho do ano anterior, já descontada a inflação, desde que respeitado o intervalo de 0,6% a 2,5%. Na prática, esses são o piso e o teto de avanço das despesas, independentemente do quadro econômico do país.
O limite de 70% da variação real da receita só será liberado caso seja cumprida a meta de resultado primário do ano anterior ao de elaboração da Lei Orçamentária Anual (LOA). Esse limite pode baixar para 50% do crescimento da despesa se houver descumprimento da meta de resultado primário nesse mesmo ano de referência.
O novo arcabouço fiscal vai substituir o atual teto de gastos, regra que limita o crescimento das despesas à inflação do período anterior e que ainda está em em vigor, tendo obrigado o governo a inclusive bloquear R$ 1,7 bilhão em investimentos.
Pode-se dizer que a aprovação do arcabouço fiscal representa uma vitória pessoal do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que precisou enfrentar resistências dentro do próprio PT ao desenho da regra, que combina metas de resultado primário com um limite de crescimento para gastos.
O presidente Lula precisou arbitrar o descontentamento dentro de uma ala do partido, que defendia uma regra fiscal mais branda, ancorada apenas na meta de primário. Contudo, Haddad fez prevalecer o entendimento de sua equipe sobre a necessidade de manter um teto para as despesas, ainda que mais flexível.
Além dos votos do PT, PP, MDB e PSD também votaram favoráveis ao projeto. Duas legendas da base aliada, PSOL e Rede, orientaram contra o texto. Já o PL do ex-presidente Jair Bolsonaro liberou a bancada.
Segundo Lira, a votação desta terça não representa a base do governo, mas sinaliza um avanço. “É uma evolução, estamos trabalhando para que isso [a base] se concretize”, disse.
Fundeb fica dentro do arcabouço fiscal
Um dos pontos de discórdia sobre o projeto nos últimos dias, a inclusão dos gastos com o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e da Valorização dos Profissionais da Educação) sob o alcance do limite do arcabouço ficou dentro do arcabouço fiscal, para descontentamento de governistas.
Eles defendiam a exclusão o Fundeb do limite sob o argumento de que educação é investimento. O próprio secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, disse que a decisão de incluir esses repasses sob o arcabouço poderia representar uma restrição do espaço fiscal no médio prazo.
O texto aprovado não altera as regras da complementação paga pela União ao Fundeb. Isso significa que o percentual continuará subindo até 23% do total de recursos do fundo até 2026, como aprovado na emenda constitucional 108/2020, e se manterá nesse patamar depois disso.
Despesas com aportes em empresas estatais não dependentes (que usam receitas próprias para bancar despesas operacionais) e repasses a estados e municípios para bancar o piso da enfermagem também ficarão sob o novo teto de despesas.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias, da Agência Câmara e da Folha de S.Paulo