Reforma tributária: entidades fazem alerta sobre brechas no texto que facilitam redução de impostos sobre armas

Instituto Sou da Paz e Oxfam elaboraram estudo conjunto, no qual dizem que a "PEC 45/2019 pode oferecer ainda mais benefícios tributários à indústria armamentista e aumentar o volume de armas em circulação", no país. Fazenda diz que vai propor ajustes no texto.
9 de outubro de 2023

O Instituto Sou da Paz e a Oxfam Brasil fizeram um alerta, na última sexta-feira (6), de que o texto do projeto de reforma tributária, que tramita atualmente no Senado, contém brechas que podem facilitar a redução do imposto sobre armas e munições no Brasil.

A nota técnica divulgada pelas entidades, com base em estudo realizado em conjunto, alerta que a “PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 45/2019 pode oferecer ainda mais benefícios tributários à indústria armamentista e aumentar o volume de armas em circulação em um país em que mais de 70% dos homicídios são cometidos com este artefato e que lesões com armas custam R$ 50 milhões aos cofres públicos todos os anos”.

As entidades lembram que o Brasil registra, anualmente, mais de 45 mil mortes, incluindo homicídios, suicídios e acidentes, segundo dados do Ministério da Saúde.

No contexto dos homicídios, as entidades lembram que 76% das mortes são perpetradas com o uso de arma de fogo, que também está presente em grande parte dos crimes patrimoniais, chegando a atingir 80% dos roubos de veículos

“Este quadro evidencia que as armas de fogo constituem um produto associado a um elevado custo para a sociedade”, dizem as entidades que querem, com o alerta, sensibilizar parlamentares a respeito do tema.

O estudo aponta que no estado de São Paulo, por exemplo, “a tributação de revólveres, pistolas e seus acessórios, cuja alíquota é de 63%, reduziria para 10% caso a proposta de reforma tributária, em discussão no Senado, seja aprovada sem alterações sobre esses pontos”.

No estado do Rio de Janeiro – que ocupa o terceiro lugar no número de homicídios dolosos (quando há intenção), segundo dados do Anuário da Segurança Pública 2023, atrás de Bahia e Pernambuco, respectivamente -, a alíquota incidente sobre esses produtos teria uma redução ainda mais drástica: de 75% para 10%.

Na tentativa de conter o comércio e o tráfico de armas, o Rio já chegou a sobretaxar em 200% armas de fogo, munições e suas partes e acessórios, medida avaliada como legal pelo STF (Supremo Tribunal Federal), por considerar os riscos à vida e integridade física envolvidos.

O Rio também se destaca em relação ao número de mortes por intervenção policial. Em 2021, liderou o ranking nacional com 1.356 registros. Já em 2022, esse número caiu para 1.330 óbitos, na segunda posição. Também nesse caso atrás da Bahia.

Bens e serviços relacionados à segurança e soberania nacional foram incluídos como exceção à alíquota padrão na reforma tributária

O problema por detrás da brecha, conforme explicam as entidades, é que a proposta em discussão no Senado pretende retirar o caráter extrafiscal dos novos impostos sobre consumo (IBS e CBS, que substituirão IPI e ICMS, além de PIS/Cofins e ISS) e transferir esse papel para o Imposto Seletivo (IS), também conhecido de “imposto do pecado”, que é de competência da União.

“Ela [a proposta] estipulou o IS [imposto seletivo] com a indicação finalística de sobretaxar a produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, deixando de abarcar outras em essencial, como à integridade física ou à vida, por exemplo”, diz o documento.

A nota técnica também lembra que lembra que, além de não sofrer a incidência do imposto seletivo, as armas e munições ainda poderiam ser beneficiadas por uma taxação menor, de 40% do valor total da alíquota padrão [para os setores não beneficiados], estimada em até 27%.

Esse problema acontece porque, segundo as entidades, os “bens e serviços relacionados à segurança e soberania nacional, segurança da informação e segurança cibernética” foram incluídos como exceção à alíquota padrão no texto que foi aprovado pela Câmara dos Deputados.

“Essa disposição é ambígua e pode ser interpretada de maneira a abranger não apenas bens relacionados à segurança nacional, mas também qualquer tipo de segurança, inclusive a segurança privada”, destacam.

O Ministério da Fazenda já se posicionou sobre o tema, dizendo que defende ajustes no trecho do texto que trata de alíquota menor para o setor de segurança nacional. Também recomendou ajustes na parte da proposta de reforma tributária que trata do imposto seletivo, de modo que seja possível que o tributo seja aplicado também a armas e munições.

O mercado de armas no Brasil foi largamente favorecido, em termos tributários, durante o governo de Jair Bolsonaro (PL).

Os mais de 40 decretos de armas de Bolsonaro visavam facilitar o acesso às armas e enfraquecer mecanismos de controle.

O Instituto Sou da Paz e a Oxfam ressaltam que, “apesar de diversos decretos sobre armas terem sido revogados no atual governo do presidente Lula, na esfera tributária ainda vigora a redução de IPI para armas e munições”.

A alíquota de IPI sobre revólveres e pistolas, conforme ressaltam, sofreu redução de 45% para 29,25% durante a gestão Bolsonaro.

Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias e do Instituto Sou da Paz

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