A volta do recesso parlamentar nesta semana, em Brasília, marca também o início das negociações em torno da votação da pauta econômica do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O pacote da pauta econômica elaborado pela equipe comandada pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda) será o primeiro teste de fogo da atual gestão para saber se tem ou não uma base aliada consolidada. Os parlamentares que assumem mandatos na esfera federal esta semana compõem um dos Congressos mais conservadores da história política do país, exigindo de Lula e aliados mais poder de barganha para conquistar os menos extremistas (ou bolsonaristas).
Isso porque o PL do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) é o maior partido da nova legislatura, com 14 senadores e 99 deputados. A federação do PT-PCdoB-PV é a segunda maior bancada da Câmara, com 80 deputados eleitos. No Senado, a situação do PT é mais difícil. A legenda elegeu nove senadores, mas alguns dos eleitos que poderiam compor a base aliada assumiram ministérios de Lula, como Flávio Dino (PSB, Justiça e Segurança Pública), Camilo Santana (PT-CE, Educação), Renan Filho (MDB-AL, Transportes) e Wellington Dias (PT-PI, Desenvolvimento Social, Assistência, Família e Combate à Fome).
As primeiras negociações da pauta econômica começaram com Arthur Lira, presidente da Câmara alçado ao posto pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Após intensa negociação e aprovação de um pacote de benesses para agradar a parlamentares, como aumento do auxílio moradia de até R$ 8,4 mil, Lira deve ser reconduzido ao cargo na eleição da mesa diretora. A expectativa é de que Rodrigo Pacheco também seja conduzido ao cargo, mas no Senado a disputa pelo cargo deve ser mais acirrada. Em troca do apoio aos dois nomes, o PT deve obter as presidências de comissões importantes, como de Constituição e Justiça.
O pacote econômico de R$ 242,7 bilhões para reduzir o rombo previsto no Orçamento de 2023 e conter o avanço da dívida pública está entre as principais prioridades do governo petista. O primeiro teste no Congresso sobre a pauta econômica nesse sentido será a aprovação da medida provisória (MP) que alterou regras do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) e que está entre as iniciativas contidas no pacote.
O Carf é o órgão que julga recursos administrativos de contribuintes que devem à Receita Federal. A mudança mais importante ocorrerá no sistema de votação. O governo retomará o voto de desempate da Fazenda, que atualmente está a cargo do Fisco. A mudança no julgamento dos conflitos tributários já foi recomendada pelo TCU (Tribunal de Contas da União). Com a medida, as chances de a Receita ganhar os processos aumentam, melhorando o caixa do governo. O governo calcula impacto de cerca de R$ 60 bilhões com ela.
Também haverá o fim dos recursos de ofício dentro do Carf para valores abaixo de R$ 15 milhões. Nesses casos, quando o contribuinte vencer em primeira instância, a Receita Federal deixará de recorrer, encerrando o litígio. De acordo com o Ministério da Fazenda, a medida extinguirá quase 1 mil processos no Carf, no valor total de R$ 6 bilhões, e ajudará a desafogar o órgão para o julgamento de grandes dívidas.
Programa de renegociação de dívidas, reforma tributária e novo arcabouço fiscal também estão na pauta econômica prioritária do governo Lula
Outra prova de fogo envolvendo a pauta econômica para o governo atual será o programa Litígio Zero, que integra o pacote da equipe econômica de Lula. Este, no entanto, deve ter caminho mais fácil que a MP do Carf, considerada mais polêmica.
O Litígio Zero funcionará nos moldes dos tradicionais Refis e prevê a renegociação em condições especiais de dívidas com a União. As pessoas físicas, micro e pequenas empresas com dívidas abaixo de 60 salários mínimos poderão obter descontos de 40% a 50% sobre o valor total do débito, com prazo de até 12 meses para pagar.
Para empresas que devem mais de 60 salários mínimos, haverá um desconto de 100% sobre multas e os juros e a possibilidade de usar prejuízos de anos anteriores para abater de 52% a 70% do débito. Segundo o Ministério da Fazenda, isso incidirá apenas sobre dívidas consideradas irrecuperáveis e de difícil recuperação.
Simultaneamente, Haddad também pretende criar o novo arcabouço fiscal para o país, em substituição ao teto de gastos (regra que limita o aumento de gastos do governo à inflação do período anterior). A ideia é discutir a proposta, que deve ser enviada ao Congresso até abril, com agentes do mercado financeiro e com Executivos fora do governo. A equipe econômica também tem se debruçado sobre o projeto de reforma tributária, que será fatiada — primeiro com as mudanças sobre o consumo e depois sobre a renda. A reforma deve ser o maior desafio para a pasta.
“O grande legado do presidente Lula será a reforma tributária, um sistema menos regressivo, um modelo mais direto na cobrança dos impostos. Um sistema mais simplificado. Um deslocamento da tributação do consumo para renda e patrimônio. Sem justiça tributária vamos continuar multiplicando os superpobres e produzindo os superricos”, disse ao jornal O Globo o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), que será vice-líder do governo na Câmara.
A base do governo para a proposta tributária serão aquelas que já estão em tramitação, como a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 45, de autoria do deputado federal Baleia Rossi (MDB-SP), presidente nacional da legenda. O texto unifica uma série de tributos sobre o consumo, como PIS/Cofins e IPI e tem hoje a preferência de Haddad nas discussões. Outra proposta, do Senado, a PEC 110, reúne mais impostos. A ideia hoje é mesclar essas duas propostas.
Segundo O Globo, Haddad já teria conversado com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), sobre o assunto. Em jantar na quinta-feira, Lula pediu ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o apoio para aprovação de pautas econômicas. O PT apoia a recondução tanto de Lira quanto de Pacheco às presidências das Casas.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias e de O Globo